Estado de São Paulo, https://www.estadao.com.br/infograficos/economia,brasileiros-inovadores-da-lista-do-mit-conheca-o-perfil-dos-cinco-jovens-eleitos,1150800#:~:text=Amanda%2C%20Fred%2C%20Gabriel%2C%20Renato,35%20anos%20na%20Am%C3%A9rica%20Latina%2C, 05/02/2021
BRASILEIROS INOVADORES DA LISTA DO MIT: CONHEÇA O PERFIL DOS CINCO JOVENS ELEITOS
Douglas Gavras
Amanda, Fred, Gabriel, Renato e Ricardo nunca se encontraram, mas fazem parte de um grupo seleto: eles são os cinco brasileiros reconhecidos internacionalmente pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), na mais recente lista dos maiores inovadores com menos de 35 anos na América Latina, publicada pelo centro norte-americano de tecnologia.
A lista “Innovators Under 35 LATAM 2020” é feita pela revista MIT Technology Review, ligada à instituição. A publicação também já destacou alguns nomes que se tornaram conhecidos mundialmente, como Mark Zuckerberg, do Facebook, e Larry Page, cofundador do Google.
O paulistano Ricardo di Lazzaro Filho completou 35 anos logo após descobrir que havia sido escolhido pelo MIT como um dos inovadores de destaque. “O prêmio é muito mais da Genera. O que a gente construiu levou a esse reconhecimento”, conta o médico, que cofundou há pouco mais de dez anos o laboratório de análises genéticas. A empresa, que é considerada um caso de sucesso no segmento e recebeu como sócio o grupo Dasa, em 2019, tem ajudado a popularizar no País os exames de ancestralidade e que ajudam a prevenir doenças.
Di Lazzaro conta que a startup, que já testou mais de 100 mil pessoas, tem parcerias com médicos que oferecem os exames aos pacientes, para ter um entendimento maior da saúde individual. Mas a maior parte dos clientes é formada por consumidores individuais. “O cliente pode comprar o kit pela internet ou em drogarias parceiras. Vai chegar na casa dele uma caixa com cotonetes e instruções. Ele passa as hastes na parte interna da bochecha, retirando as células mais superficiais, e as coloca de volta no envelope.”
Os grandes produtores são abastecidos com tecnologia, mas os pequenos não têm essa oportunidade.”
Renato Borges, Fundador da Agrointeli
No ano passado, a Genera cresceu mais de 20 vezes em número de testes vendidos, na comparação com o ano anterior. De acordo com a empresa, o resultado reforça que há um interesse crescente dos brasileiros pela busca por testes que apresentem mais informações sobre sua herança genética.
Foram justamente as raízes familiares que ajudaram outro dos selecionados pelo MIT a construir seu negócio, mas de forma diferente. Neto de pecuaristas e bisneto de agricultores, Renato Borges, de 28 anos, via em casa a família reclamar há anos dos mesmos problemas: a falta de previsibilidade das chuvas ou as incertezas sobre a forma de combater pragas na lavoura. “Nasci no campo, sou desse mundo. Minha família cultivava soja na safra, milho na safrinha e gado. Tinha tudo para ser engenheiro agrônomo, mas sempre fui ligado em tecnologia e por isso acabei optando pela engenharia da computação. Quando terminei meu mestrado, descobri que não queria seguir na academia. Voltei para o campo para aliar o mundo rural ao da tecnologia.”
Ele conta que a ideia ao criar a Agrointeli — um sistema que conecta o agricultor às propriedades — era democratizar o acesso à tecnologia no campo. A empresa, que começou em 2017 prestando serviços para cinco propriedades rurais em Mato Grosso do Sul, hoje está presente em dez Estados e atua em outros países da América Latina, como Bolívia, Chile e Paraguai. “Os grandes produtores são sempre abastecidos com tecnologia, mas os pequenos e médios não têm essa oportunidade.”
Borges reforça que o prêmio vem em um momento de destaque para o agronegócio. Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a soma de bens e serviços gerados no agronegócio chegou a R$ 1,55 trilhão ou 21,4% do PIB brasileiro. O destaque para o setor se deve, em grande parte, à produtividade crescente no campo nos últimos anos.
Cofundador da pernambucana TiSaúde, Fred Rabelo conta que a empresa também surgiu de uma experiência pessoal. Filho de um comerciante e de uma costureira e sem ter plano médico quando era mais jovem, o engenheiro decidiu se aprofundar durante a faculdade na área de tecnologia para a saúde, com o objetivo de democratizar o acesso ao acompanhamento médico. Após estudar no exterior, ele fundou a empresa em 2016, ao lado dos irmãos: Fábio, que é médico, e Flávio, advogado.
“A gente saiu do zero, apesar de nossos pais sempre terem se esforçado para investir na nossa educação. No começo da faculdade, tive o primeiro contato com a tecnologia para a saúde, estagiando no núcleo de pesquisas do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Em 2011, fiz um intercâmbio no Texas e gostei bastante de aplicar na área de saúde o conhecimento técnico da engenharia”, conta Rabelo, de 30 anos.
A meta agora é usar a plataforma para ajudar a organizar as duas etapas de vacinação contra a covid-19 em cidades, alertando prefeituras e a população quando for o momento de tomar a segunda dose da vacina.
Única mulher do grupo, Amanda Pinto, de 29 anos, trouxe para a empresa da família (o grupo granjeiro Mantiqueira) uma alternativa para oferecer opções de ovos, o produto tradicional da empresa, de outra maneira. Ela criou a N.Ovo, uma foodtech de alimentos feitos de planta.
O projeto começou em 2017 e o primeiro produto chegou ao mercado em março de 2019. A N.Ovo surgiu como parte do portfólio do Grupo Mantiqueira, maior produtor de ovos do País. Lançado para ser mais um produto oferecido pela empresa, o projeto ganhou vida própria e o que era um produto do grupo, se transformou em marca própria de uma startup.
“Gostei tanto desse mercado e vimos tantas oportunidades para solucionar problemas globais ligados à alimentação, que entendi que poderia virar um novo negócio”, conta Amanda. Em outubro do ano passado, o produto virou uma marca separada, focada em produtos à base de plantas que substituem os de origem animal, como maioneses e substitutos para ovos mexidos.
Estamos longe dos transplantes com tecidos de laboratório, mas já conseguimos investigar o uso de medicamentos.”
Gabriel Linguori, cofundador da TissueLabs
No caso de Gabriel Liguori, uma experiência na infância foi definitiva para que ele optasse pela carreira que lhe daria reconhecimento agora. Diagnosticado com uma má-formação no coração, ele passou por uma cirurgia cardíaca aos 2 anos de idade — e boa parte dos anos seguintes fazendo visitas regulares ao Instituto do Coração (InCor), em São Paulo.
Ele acabou indo estudar medicina na USP, especializou-se em cardiologia e agora quer se tornar o primeiro médico a “imprimir” um coração, por meio da startup que co-fundou. Com a TissueLabs, ele desenvolveu uma técnica para fabricar órgãos e tecidos em laboratório, por meio de uma impressora 3D. “Ainda estamos longe de poder fazer transplantes com esses tecidos de laboratório, mas já conseguimos investigar o uso de medicamentos. Se o paciente tem uma doença específica e há três opções de medicação que o médico pode receitar, por exemplo, para descobrir qual funciona melhor, em vez de testar todos os remédios nele, a gente recria um pedaço do coração no laboratório, com células-tronco, e vê qual funciona.”
Uma das frentes mais recentes de atuação da startup é a disponibilização de uma plataforma gratuita para estudos de células do pulmão, que pode ser usada no combate ao novo coronavírus. Por meio da tecnologia, é possível personalizar o tipo e origem das células que vão ser estudadas e criar tecidos tridimensionais personalizados, para entender como age o vírus.
Na contramão
Os inovadores brasileiros, infelizmente, são pontos fora da curva em um País que tem um longo caminho a percorrer para melhorar tanto no volume de recursos investidos em ciência, tecnologia e inovação quanto na forma como isso é feito. “O País investe menos da metade, em proporção do seu Produto Interno Bruto (PIB), que os Estados Unidos, por exemplo”, diz Hudson Mendonça, pesquisador do LabrInTOS da COPPE/UFRJ.
“O governo atual está tirando qualquer possibilidade de reação da ciência brasileira”, avalia Glauco Arbix, coordenador do Observatório da Inovação da Universidade de São Paulo (USP). “O Brasil se encontra em uma situação talvez inédita: as agências de pesquisa estão reduzidas à inação, por conta do corte de verbas. As inovações que surgiram durante a pandemia foram por pessoas que fizeram com seus recursos, sem grande ajuda.”
No ano passado, o Brasil subiu quatro degraus no Índice Global de Inovação (OGI), da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Wipo, na sigla em inglês), ficando com o 62º lugar. Mas a melhora de posição não foi por mérito, já que a pontuação foi pior que a de um ano antes, e sim pela queda no desempenho de outros países.
EXPEDIENTE
Editor executivo multimídia Fabio Sales / Editora de infografia multimídia Regina Elisabeth Silva / Editores assistentes multimídia Adriano Araujo, Carlos Marin e William Mariotto / Designer Multimídia Dennis Fidalgo / Edição: Cátia Luz / Reportagem Douglas Gavras