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> Zero Hora,
23/06/2009 – Porto Alegre RS



Jornalista diplomado aprende o quê?

Mágda
Rodrigues da Cunha


Muitos são os debates desde o dia 17 de junho, quando o STF
decidiu pela extinção da obrigatoriedade do diploma para exercício da
profissão de jornalista. Fala-se em retrocesso histórico, manutenção de
qualidade de parte das empresas, garantia da liberdade de expressão prevista
na Constituição, comparação com outras categorias profissionais e até com
arte e literatura. Mas quem estuda para ser jornalista aprende o quê? E este
é um foco pouco iluminado até agora e que é papel das instituições de Ensino
Superior esclarecer. Neste texto, falamos do lugar do ensino de Jornalismo,
que existe há aproximadamente 60 anos no Brasil, quando o diploma sequer era
obrigatório.

 


E o que o jornalista aprende desde então? Arte, produção de
informação desqualificada, repressão à liberdade de expressão? Certamente
não, mesmo que muitas declarações levem a esse entendimento. O jornalismo é,
talvez, a mais multidisciplinar das carreiras, pois, para transformar os
fatos em narrativas jornalísticas, é preciso conhecer a realidade, sua
construção, 


contexto e as formas de melhor apurar o fato, investigá-lo e
difundi-lo. O jornalista aprende a ser o guardião da narração eticamente
correta. O principal produto do jornalismo contemporâneo, a notícia, não é
ficção. Os acontecimentos ou personagens das notícias não são invenção dos
jornalistas. Como aponta a própria campanha de “45 anos de Zero Hora”, o
jornal não publica nenhuma notícia, a menos que ela aconteça.

 


Um jornalista aprende português, filosofia, história,
legislação, sociologia, entre outras disciplinas. O que não quer dizer que
indivíduos com a formação nessas áreas possam narrar os acontecimentos. Um
jornalista aprende técnicas específicas de sua profissão, como reportagem,
edição, linguagens para as diferentes mídias, estudos de recepção, formas
adequadas de tratar um acontecimento, considerando princípios éticos.
Jornalismo não oferece risco de vida? Imagine-se as consequências para
qualquer indivíduo que tenha acontecimentos mal apurados e amplamente
divulgados na mídia a respeito de sua vida. E que


condições emocionais tem um soldado de narrar os fatos por
seu blog, diretamente de uma guerra? Pode um torcedor narrar o jogo de seu
próprio time e garantir alguma imparcialidade?

 


Em plena sociedade da informação, é impossível falar em
restrição à liberdade de expressão. A telefonia celular e a internet já
estabelecem novas relações entre os cidadãos e o poder. Cada um é capaz de
contar a sua história, mas não o fato sob suas muitas dimensões. Isto é
função do jornalista. Nessa mesma sociedade, precisamos de garantias legais
e regulação para que estejam bem formados aqueles que vão fazer a mediação
em meio a tanto conteúdo. Aqueles que vão garantir credibilidade aos fatos
que nos chegam das mais diversas frentes. Os soldados e torcedores não
desejam narrar os fatos jornalisticamente. Desejam apenas, como apontam as
pesquisas, usufruir da liberdade de expressão que as modernas tecnologias
oferecem. O jornalista aprende na universidade exatamente sobre qual é o seu
lugar dentro da narração de um fato.

Categorias: Jornalismo

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