Folha de São Paulo, Empregos, domingo, 20 de fevereiro de 2011

Temor ronda aprovados em concursos



Suspensão de nomeações na esfera federal altera projeto de vida de profissionais
que aguardam efetivação



Fim da validade de seleções que esperam aval pode comprometer efetivação de
colocados em cadastro de reserva

MARCOS DE VASCONCELLOS, DE SÃO PAULO


Após a suspensão de concursos e nomeações para cargos públicos por tempo
indeterminado, anunciada pela ministra Miriam Belchior (Planejamento) no último
dia 9, muitos trabalhadores que planejavam entrar na carreira pública tiveram de
mudar seus planos.


Por enquanto, não há prazos nem critérios para futuras nomeações, informou o
ministério à Folha.


A validade de concursos como o do Banco Central, cujas nomeações dependem do
ministério, pode acabar durante a suspensão, tirando de colocados em cadastro de
reserva chance de efetivação.


Aprovado em concurso para especialista da Aneel (Agência Nacional de Energia
Elétrica) em 2010, Roberto Alves, 41, largou o emprego em Manaus (AM) em
setembro, quando foi convocado pela agência para ir a Brasília fazer o curso de
formação obrigatório para o cargo.


“Disseram que a nomeação seria em janeiro”, diz ele, que não foi nomeado, mas
alugou casa em Brasília e vendeu o carro para pagar o aluguel e os estudos do
filho.


A agência diz que enviou o pedido de nomeações para o Ministério do
Planejamento. Acrescenta que todos os participantes do curso são nomeados,
apesar de não haver previsão para a efetivação.

Suspensão afeta 10% dos concursos




Associação prevê oferta de vagas maior neste ano em relação às 19 mil
autorizadas por ministério em 2010

DE SÃO PAULO



Os concursos que dependem da autorização do Ministério do Planejamento
representam cerca de 10% das vagas disputadas em concursos públicos no Brasil. A
estimativa é da Anpac (Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos).



Em 2010, o ministério autorizou 19.225 vagas, 8,6% das disputadas em âmbito
federal no mesmo ano. Esse número representa queda de 40% em relação aos postos
que haviam sido aprovados em 2009 (31.646).



O ministério não comentou os motivos da redução.



Para o presidente da Anpac, Ernani Pimentel, com a suspensão de concursos e
nomeações, será feita uma análise da necessidade de contratações. Com isso, diz
ele, a ministra Miriam Belchior “vai constatar que precisa contratar mais do que
[o anteriormente] previsto”.



A estimativa da entidade é a de que o número de vagas volte aos patamares de
2009 -neste ano, seriam abertos 139 concursos de abrangência nacional,
totalizando cerca de 34.300 vagas.



O autor do livro “Manual do Concurseiro” (editora Ferreira), Ricardo Ferreira,
diz acreditar que a suspensão das seleções e das contratações será rápida.
Segundo ele, adiamentos são comuns em transições de governo.



É o que espera o farmacêutico Raphael de Souza, 24, que passou dois anos e meio
estudando para seleções.



Em 2010, o profissional foi aprovado para um cargo técnico do Banco Central. No
mesmo ano, foi um dos 150 chamados para fazer o curso de capacitação do banco. O
número de vagas no edital era 75, mas Souza acreditava que poderia ser chamado.



“Como pagaram ajuda de custo e deram cursos, pensamos que fossem nos contratar.
Um amigo que trabalha lá falou que a gente ia ser nomeado esse semestre.”



O prazo do concurso vence em julho e, para Souza, há pouca esperança de
contratação. “Do mesmo jeito que fiquei feliz quando passei, agora fiquei
frustrado.”



A assessoria do banco informou que a participação no curso não garante a
nomeação do candidato.

Prejudicados têm direito a contrato




Aprovado dentro do número de vagas autorizadas tem de ser nomeado antes do fim
da validade do concurso

DE SÃO PAULO



A Justiça brasileira tem considerado que os candidatos aprovados dentro do
número de vagas descritas no edital do concurso devem ser, obrigatoriamente,
nomeados. Apesar de não ser lei, o entendimento é adotado nos julgamentos do STF
(Supremo Tribunal Federal).



O candidato que julgar ter sido prejudicado pela suspensão de nomeações deve
procurar um advogado e entrar na Justiça.



Mas é preciso que o processo seja movido antes do encerramento do prazo de
validade da seleção, orienta o advogado especialista em concursos José Sena.



Após o encerramento desse período, “pode haver o entendimento de que o direito à
nomeação caducou”.



Para profissionais classificados em cadastro de reserva, o direito à nomeação
não é claro. “A administração pública não tem compromisso com aquele candidato
que ficou no cadastro”, afirma.




SEM PREJUÍZOS



Na avaliação de professores de cursinhos preparatórios, ninguém sairá
prejudicado com o adiamento das seleções públicas neste ano.



“Alguns concursos federais vão ser empurrados para frente e devem se concentrar
no segundo semestre”, considera Paulo Estrella, diretor do Complexo Educacional
Damásio de Jesus.



Para ele, isso significa que o candidato a uma vaga ganhará “dois ou três meses
a mais de preparação”.



O diretor de recursos humanos da Central de Concursos, José Luis Romero,
complementa: o Estado será obrigado a realizar alguns certames para setores nos
quais há urgência de melhoria.



“A Infraero [Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária], por exemplo,
lançou edital nessa semana para 95 vagas. O Banco do Brasil é outro que, por ser
um órgão público que compete com bancos privados, se não contratar mais
servidores, perderá espaço no mercado.”



FOCO

Para concursanda, opção é dedicar-se à seleção estadual

DE SÃO PAULO


Aos 59 anos, Mariza Viana estuda para passar em concursos públicos.


Quando decidiu ser servidora, Viana, que cursou até o terceiro ano de psicologia
em 1970, matriculou-se no ensino médio e ingressou em um cursinho preparatório.


Com a possibilidade de haver corte no número de vagas oferecidas em seleções,
Viana diz acreditar que será mais difícil passar na prova para técnico
previdenciário do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), uma de suas metas
para 2011. “Estavam previstas 2.400 vagas, mas, agora, com cortes, deverão ser
1.500”, avalia.


Apesar de se considerar diretamente afetada pela suspensão dos concursos e das
contratações, ela afirma concordar com a ação governamental. “Como cidadã, eu
vejo que a presidente Dilma tinha que fazer cortes.”


Mas Viana também percebe, na política adotada, um antagonismo. “Nas várias vezes
em que assisti à campanha [eleitoral] dela [Dilma Rousseff], ela falou sobre
melhoria do serviço público. Não consigo entender como poderá melhorar o serviço
sem contratar pessoas.”


Por enquanto, sua intenção é continuar a estudar. “Posso prestar concursos para
os Estados e para o Poder Judiciário”, considera ela.

 

 


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