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Folha de São Paulo, Cotidiano, DOMINGO, 23 DE FEVEREIRO DE 2014

Alunos de federais trocam vaga do Sisu por particulares

MEC constata que com sistema de seleção
estudantes que entram em cursos sem desejar acabam migrando

Ministério da Educação vai apresentar, até o
meio do ano, medidas para preencher as vagas deixadas pelos calouros

FÁBIO TAKAHASHIDE
SÃO PAULO

O sistema unificado de seleção de calouros, o
Sisu, levou mais alunos a disputar vagas nas universidades federais. Parte
deles, porém, migrou rapidamente para a rede particular.

A constatação é do próprio Ministério da
Educação e da Andifes, entidade de reitores das universidades federais.

As duas instituições desenvolvem estudo para
medir o tamanho da migração, detectada em análise preliminar.

Paralelamente, universidades afirmam já terem
sentido aumento na evasão após a entrada no Sisu, implementado em 2010. É o caso
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Quarta instituição que mais recebeu
inscritos em 2013, sua taxa de evasão subiu de 20% para 35%.

O abandono também cresceu na federal tecnológica
do Paraná e na estadual do Piauí (veja mais no quadro).

Mesmo sem ter a quantidade exata de alunos que
deixaram os cursos, o MEC analisa o volume como “importante” e decidiu
apresentar, até o meio do ano, medidas para preencher essas vagas.

O PROCESSO

Segundo a gestão Dilma Rousseff (PT), os dados
levantados apontam que os alunos que saíram dos cursos, basicamente, vão para
outros. E a evasão geral não se altera.

A explicação do ministério para o fenômeno é
que, com o Sisu, o aluno tem mais facilidade em ingressar na rede federal –pelo
sistema, ele disputa vagas no país todo apenas com a nota no Enem.

O problema é que aquele que possui nota mais
baixa tende a entrar não no curso que deseja, mas no que sua nota foi
suficiente.

Ao mesmo tempo, também com o Enem, ele pode
conseguir vaga na rede particular (menos disputada), na área que desejava. E
custeado pela União por meio do Prouni (bolsas de estudo) ou do Fies
(financiamento).

Assim, o aluno que queria engenharia, mas entrou
em licenciatura na federal, pode em um ou dois anos conseguir vaga em
engenharia, em faculdade particular.

“Para o aluno, a situação é ótima. Ele, no fim,
estuda o que queria”, disse à Folha o
secretário de Educação Superior do MEC, Paulo Speller. “Mas é ruim para a
instituição, pois a vaga fica ociosa.”

TERCEIRA OPÇÃO

Isaias da Silva, 23, ilustra essa migração. Ele
queria curso tecnológico ou licenciatura em letras na federal rural de
Pernambuco.

“Mas eu só tinha nota para biologia. Não era o
que queria, mas era o que eu tinha mais afinidade”, diz. Ele não se adaptou e,
após dois meses, deixou o curso para entrar em gestão em petróleo, particular,
com Fies.

“A migração não é necessariamente negativa,
porque o aluno encontra o que responde às suas expectativas”, afirma o
pesquisador Roberto Lobo, ex-reitor da USP. “Mas não está claro como a migração
afeta o desenvolvimento do curso, a qualidade do ensino superior.”

O número de inscritos no programa subiu de 800
mil, em 2010, para os atuais 2,6 milhões.

“No modelo de vestibular, o aluno já considerava
seu desempenho ao escolher um curso”, diz o representante dos reitores federais,
Jesualdo Farias. “Mas agora, como o Sisu cresceu, queremos avaliar o impacto no
sistema”

Universidades divergem ao avaliar programa de seleção


Instituições de ensino criticam modelo de escolha dos
cursos, mas afirmam que balanço do Sisu é positivo


Sistema criado há 4 anos pelo MEC promete democratizar ensino superior; oposição
vê pressão sobre o Enem

DE SÃO PAULO


Aumento da evasão de estudantes, menos custos, alunos melhores em seus cursos.
As avaliações das universidades federais em relação ao Sisu (Sistema de Seleção
Unificada) são divergentes.

Para
a federal rural de Pernambuco, um problema do programa é que o estudante pode se
candidatar para até dois cursos, em áreas totalmente diferentes.

“Os
candidatos, na maioria, são jovens e têm outras oportunidades”, disse a reitora
Maria José de Sena. “Eles inicialmente escolhem o curso pela nota, não pela
vocação. E depois vão em busca do curso de preferência.”

A
estadual do Piauí, que viu a evasão em medicina e engenharia civil saírem de 0%
para 14% e 40%, afirma que o resultado final do Sisu é positivo (o sistema
aceita universidades estaduais).


Apesar do aumento da evasão, a instituição aponta que não precisa gastar com o
vestibular e que recebe verba federal para ajudar os alunos.

A
Universidade Tecnológica Federal do Paraná e a UFABC (SP) argumentam que o
programa permitiu que estudantes de outros Estados procurassem as instituições,
o que ajuda a melhorar o corpo discente.


LEVANTAMENTO

Folha pediu
os dados de evasão das dez universidades que mais receberam inscritos no Sisu no
ano passado. Cinco não forneceram informações atualizadas.

Três
delas disseram que a evasão subiu após a entrada no sistema: federal rural de
Pernambuco, estadual do Piauí e tecnológica do Paraná. Essa última ponderou que
a expansão de vagas pode ter influenciado o resultado.

A
UFRJ (federal do Rio de Janeiro) afirmou que o índice não se alterou. Já os
dados da UFSCar, de São Carlos, indicam aumento de evasão, mas, devido à
metodologia adotada, não é possível precisar se isso está relacionado ao Sisu.


MAIS POBRES

O
modelo foi criado pelo então ministro da Educação Fernando Haddad (PT), hoje
prefeito de São Paulo.

A
premissa era a de democratização do ensino superior, pois os alunos,
especialmente os mais pobres, podem disputar vagas sem ter de viajar para os
vestibulares.

O
sistema seleciona estudantes com base nas notas obtidas no Enem (Exame Nacional
do Ensino Médio).


Partidos de oposição afirmam que o Sisu colocou muita pressão no Enem, pois, com
uma única prova, o aluno disputará centenas de milhares de vagas.

Os
reitores da universidades federais cobram da União mais verbas para ajudar
alunos pobres que tenham de se mudar para estudar.


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