Folha de São Paulo, Ombudsman, domingo, 02 de agosto de
2009
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
A internet a serviço do jornalismo
Há quem enxergue na internet um inimigo do jornalismo; é um erro conceitual e
estratégico
OS
JORNAIS americanos, por estarem enfrentando crise sem precedentes, concentram
esforços para criar instrumentos para reforçar seus vínculos com os leitores e
sua relevância junto à sociedade.
O "New
York Times" recebeu na semana passada o prêmio Knight-Batten, que reconhece
inovações no jornalismo, por suas novas ferramentas capazes de aumentar o
controle social sobre as autoridades.
Uma
delas se chama "Represent". Com ela, o leitor de Nova York é capaz de acompanhar
interativamente as atividades de seus representantes nos diversos níveis de
governo.
O
jornal coloca à disposição numa espécie de "facebook" informações factuais e
reportagens sobre cada político, seus votos, discursos, e permite ao leitor
escrever comentários e mensagens.
Durante a eleição de 2008, o "Times" colocou no seu site a íntegra em vídeo dos
principais discursos e dos debates entre Barack Obama e John McCain, com a sua
transcrição ao lado, o que permitia fazer buscas no texto ou remeter-se a partes
específicas do maior interesse de cada pessoa, o que não é possível para quem
está assistindo apenas ao vídeo.
Coisa
parecida é o "Document Reader", por meio do qual o jornal posta documentos
públicos de qualquer tamanho e permite ao leitor procurar trechos que mais lhe
interessem, assinalar passagens, fazer comentários à margem.
O "St.
Petersburg Times" tem o "Polifact", que apura a veracidade de promessas ou
declarações de candidatos a cargos públicos ou autoridades no exercício do
mandado e coloca o resultado de sua apuração à disposição da audiência.
Parceiro constante de jornais que se aventuram nesses experimentos é o site
Propublica (http://www.propublica.org),
sem fins lucrativos, que se proclama independente e dedicado a produzir
"matérias importantes com força moral" resultantes de trabalho investigativo
autônomo. Ele foi estabelecido em 2007, com dinheiro da Fundação Sandler, dos
banqueiros Herbert e Marion Sandler, e é dirigida por jornalistas que deixaram o
"Wall Street Journal".
Estes
são alguns exemplos de como a internet pode contribuir muito positivamente para
melhorar a qualidade do jornalismo e das relações entre a sociedade e seus
governantes.
Há
quem enxergue na internet um inimigo do jornalismo. É um erro conceitual e
estratégico. A internet é apenas um meio, como o rádio, a TV, o papel, em que se
pode fazer jornalismo.
O
jornalismo americano está em crise de modelagem de negócio, não de público.
Nunca os grandes jornais diários tiveram tantos leitores quanto agora, graças à
internet. Mas eles ainda não conseguiram achar a fórmula que transforme essa
leitura em receita.
Uma
das empresas jornalísticas mais lucrativas no momento nos EUA é o "Congressional
Quarterly" (CQ), que se dedica apenas à cobertura das atividades do Congresso
dos EUA. Ele acaba de ser vendido pelo "St. Petersburg Times" para um
concorrente como forma de salvar o jornal diário de seus problemas.
O
sucesso do CQ e das iniciativas acima mencionadas mostram que uma ligação
orgânica entre jornalismo e acompanhamento de políticas públicas pode ser um
caminho promissor.
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