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O Estado de São Paulo, Domingo, 15 de Fevereiro de 2009

Como salvar os
jornais (e o jornalismo)

Walter Isaacson *

Durante os
últimos meses, a crise no jornalismo atingiu proporções de derretimento. Agora é
possível contemplar num futuro próximo uma época em que algumas grandes cidades
não terão mais seu próprio jornal e as revistas e redes de notícias empregarão
apenas um punhado de repórteres.

 

Há, no
entanto, um fato chocante e algo curioso a respeito desta crise. Os jornais têm
hoje mais leitores do que nunca. O seu conteúdo, assim como o das revistas de
notícias e de outros produtores do jornalismo tradicional, é mais popular do que
jamais foi – até mesmo (na verdade, especialmente) entre o público jovem.

 

O problema
é que um número cada vez menor de leitores está pagando pelo que lê. As
organizações jornalísticas estão distribuindo gratuita e alegremente as suas
notícias. De acordo com um estudo realizado pelo Centro de Pesquisas Pew, no ano
passado houve uma virada marcante: nos Estados Unidos, as notícias gratuitas
disponíveis na internet foram mais procuradas do que os jornais e revistas pagos
que publicavam o mesmo conteúdo. Quem pode se espantar com isso? Até mesmo eu,
um antigo viciado em publicações impressas, deixei de assinar o New York Times,
porque se o jornal não acha justo cobrar pelo acesso ao seu conteúdo, eu me
sentiria um tolo pagando por ele.

 

Esse modelo
comercial não faz sentido. Talvez esse sistema tenha dado a impressão de fazer
sentido quando a publicidade eletrônica estava prosperando e qualquer editor
parcialmente consciente podia fingir fazer parte do clã que "compreendia" as
mudanças da época ao entoar o mantra de que "o futuro" estava na publicidade na
internet. Mas quando a publicidade eletrônica entrou em declínio no último
trimestre de 2008, o futuro do jornalismo parecia ser gratuito assim como um
penhasco íngreme é o futuro de um bando de lemingues.

 

Tradicionalmente, jornais e revistas contam com três fontes de receita: as
vendas nas bancas, as assinaturas e a publicidade. O novo modelo de negócios
fia-se apenas na terceira dessas fontes. O resultado é uma cadeira de um pé só,
de equilíbrio sempre tênue, por mais forte que esse pé seja. Quando o seu apoio
fraqueja – o que incontáveis editores viram ocorrer como resultado da recessão –
a cadeira não pode se manter de pé.

 

Nas últimas
semanas, testemunhamos o fechamento completo de uma série de jornais locais,
vimos a Tribune Company (dona do Los Angeles Times) pedir concordata, a Lee
Enterprises ser retirada da lista da Bolsa de Valores de Nova York e o anúncio
de uma nova rodada de demissões de fim de ano na Gannet e em outras empresas,
reduzindo sua força de trabalho em 10% ou mais.

 

Henry Luce,
cofundador da revista Time, desdenhou da noção das publicações gratuitas que
dependem apenas da receita proveniente da publicidade. Ele chamou esta fórmula
de "moralmente repugnante" e também de "economicamente inviável e derrotista".
Isso porque ele acreditava que o bom jornalismo exigia que o compromisso
primário de uma publicação fosse com os seus leitores, e não com os seus
anunciantes. Num modelo em que a única fonte de renda passa a ser a receita
publicitária, o incentivo é perverso. Ele é também inviável e derrotista porque,
afinal, o elo de uma publicação com o público leitor vai definhar se ela não
sentir que a sua renda é diretamente dependente desse público. Os jornais
acabarão produzindo vários cadernos especiais sobre decoração e jardinagem,
coisa que desejam os anunciantes, e terão de se livrar dos cadernos de resenhas
literárias, como já fizeram o Los Angeles Times e o Washington Post.

 

O dr.
Johnson dizia que, quando um homem sabe que será enforcado em questão de duas
semanas, sua mente se mostra extraordinariamente concentrada. Estamos
testemunhando esta quinzena final do jornalismo e suspeito que 2009 será
lembrado como o ano em que as organizações jornalísticas perceberam que novas
rodadas de cortes de gastos não podem afastar indefinidamente o carrasco.

 

Uma opção
de sobrevivência experimentada por algumas publicações, como o Christian Science
Monitor e a Detroit Free Press, é eliminar ou reduzir drasticamente as suas
edições impressas e se concentrar em vez disso nas suas páginas gratuitas
disponíveis na internet. Para muitas publicações e consumidores, isso faz
sentido. Essa será, como é de se esperar, uma das tendências para o futuro.
Outras podem tentar suportar o longo inverno esperando que a concorrência pereça
e rezando para que possam abocanhar uma fatia do mercado publicitário grande o
bastante para viabilizar a sua existência enquanto sites gratuitos. Tudo bem.
Precisamos de uma variedade de estratégias concorrentes.

 

Entretanto,
essas abordagens diferentes ainda obrigam uma publicação a depender totalmente
dos seus anunciantes. Assim, espero que nesses anos vejamos o alvorecer de uma
ousada e antiga ideia que oferecerá uma outra opção para algumas organizações
jornalísticas: serem pagas pelos usuários em função dos serviços prestados e do
jornalismo produzido. Se isso ocorrer, a implosão da publicidade em 2008 trará
consigo o benefício de ter criado uma estratégia de negócios que permita às
publicações o estabelecimento de um vínculo mais forte com os seus leitores.

 

Esta noção
de cobrar pelo conteúdo é uma ideia antiga não apenas porque jornais e revistas
fazem isso há mais de quatro séculos. É também algo que eles costumavam fazer no
início da era das publicações online, no começo da década de 1990. Naquela época
havia apenas um bando de empresas provedoras de serviços online, como Prodigy,
CompuServe, Delphi e AOL. Elas costumavam cobrar dos usuários em função dos
minutos que os mesmos passavam online e naturalmente era do seu interesse manter
estes usuários acessando a rede pelo maior tempo possível. Como resultado, o
conteúdo de qualidade era valorizado. Quando eu era encarregado do recém-criado
departamento de mídia online da Time naquela época, nós recebíamos todos os anos
propostas da AOL e da CompuServe; certo ano, a oferta pela nossa revista e
portal de notícias chegou a US$ 1 milhão.

 

Então
surgiram as ferramentas que tornaram mais fácil o acesso direto à internet dos
usuários e das publicações, que se libertaram dos jardins murados criados pelos
provedores de acesso. Havia diversos protocolos para a publicação e a pesquisa
de conteúdo na internet. Seus nomes eram cômicos, como Gopher e Archie, outros,
prosaicos, como Protocolo de Transferência de Arquivos e World Wide Web.
Lembro-me de uma conversa, com Louis Rossetto, na época editor da revista Wired,
em que discutimos como levar nossas revistas diretamente para a internet – sem
passar pela AOL ou CompuServe – e concluímos que a melhor forma era usar a
linguagem de marcação de hipertexto e os protocolos de transferência que
definiam a World Wide Web. As revistas Wired e Time mergulharam na rede na mesma
semana de 1994 e, em questão de um ano, a maioria das demais publicações tinha
feito o mesmo. Inventamos coisas como o anúncio em formato de banner, que trouxe
consigo um aumento na renda publicitária, e por isso não nos preocupamos muito
em impor taxas de assinatura. Mas o resultado final foi que deixamos de ser
pagos em função do nosso conteúdo.

 

Uma das
ironias da história é que o hipertexto – uma estrutura de links para outras
páginas da rede a partir do texto de uma página original – foi inventado por Ted
Nelson no início da década de 1960 com o objetivo de viabilizar a
disponibilização de conteúdo em troca de micropagamentos. Ele queria garantir
que as pessoas que criavam bons textos fossem recompensadas pelos mesmos. Na sua
visão, todos os links de uma página facilitariam o acúmulo de pequenos
pagamentos automáticos correspondentes a qualquer conteúdo que fosse acessado.
Em vez disso, a rede se viu apanhada pelo ethos que determina que a informação
deseja ser livre. Outros mais inteligentes do que nós tinham evitado essa
armadilha.

 

Por
exemplo, quando Bill Gates percebeu, em 1976, que programadores amadores estavam
compartilhando livremente o Altair BASIC, um código que ele e seus colegas
tinham desenvolvido, ele enviou uma carta aberta aos membros do Clube da
Computação Caseira pedindo a eles que parassem. "Vocês estão prejudicando a
autoria de bons programas de computador", queixou-se ele. "Quem pode se dar ao
luxo de oferecer um serviço profissional gratuitamente?" Os dólares fáceis
provenientes da publicidade na internet no final da década de 1990 incentivaram
jornais e revistas a disponibilizar gratuitamente nas suas páginas eletrônicas
todo o seu conteúdo, acrescido de blogs e outros recursos atraentes. Mas a maior
parte do dinheiro vindo da publicidade online acabou nas mãos de grupos que não
criavam de fato muito conteúdo, especialmente conteúdo jornalístico, mas em vez
disso pegavam carona nele: ferramentas de busca, portais e demais reunidores de
material alheio que compilavam suas páginas a partir de links e redirecionadores.

 

Outro grupo
que se beneficia desse sistema no qual o conteúdo, o jornalismo e as informações
são todos oferecidos gratuitamente é o dos provedores de acesso à internet, que
incluem as grandes empresas de telefonia e televisão a cabo. Eles cobram dos
seus clientes entre US$ 20 e US$ 30 por mês em troca do acesso aos tesouros do
conteúdo gratuito e dos serviços disponíveis na rede. Como resultado, não é do
interesse deles facilitar para os criadores de conteúdo o desenvolvimento de
maneiras através das quais esses poderiam cobrar pelo material que produzem.
Assim, temos um mundo no qual as empresas de telefonia acostumaram os
adolescentes a pagar até US$ 0,20 por mensagem de texto no celular, mas parece
tecnológica e psicologicamente impossível conseguir que as pessoas se disponham
a pagar US$ 0,10 por uma revista, jornal ou transmissão jornalística.

 

Atualmente,
alguns jornais, dos quais o mais notável é o Wall Street Journal, cobram pelo
acesso às suas edições eletrônicas por meio da exigência de uma assinatura
mensal. Quando Rupert Murdoch adquiriu a publicação, ele comentou publicamente a
possibilidade de abrir mão da taxa de assinatura. Mas Murdoch é, acima de tudo,
um executivo esperto.

 

Ele
analisou o lado econômico da questão e decidiu que era loucura abrir mão de
tamanha fonte de renda – e isso foi antes de o mercado da publicidade eletrônica
começar a se contrair. Agora essa jogada parece realmente inteligente. As
assinaturas pagas da página do jornal aumentaram mais de 7% durante um ano de
2008 extremamente desanimador.

 

Além disso,
ele assustou o New York Times a ponto de o jornal abrir mão das suas próprias
tentativas pouco enérgicas de aumentar a renda proveniente das assinaturas, que
tinham como base a premissa (na minha opinião equivocada) de que a cobrança
seria em função da experiência do jornal e não das suas grandes reportagens.
(Nota do autor: Após a publicação deste artigo o New York Times negou
veementemente que o seu raciocínio tenha sido influenciado por considerações
externas: eu aceito a explicação deles.) Mas eu não acredito que as assinaturas
possam resolver o problema – e não acho que elas sejam a única maneira de cobrar
pelo acesso ao conteúdo. Uma pessoa que deseja acessar a edição do dia de um
jornal ou que é levada a um artigo interessante por meio de um link dificilmente
vai pagar o preço de uma assinatura e se submeter às inconveniências dos
desajeitados sistemas de pagamento atuais. Acredito que a chave para atrair
renda por meio dos serviços oferecidos na rede seja estabelecer um sistema de
micropagamento tão simplificado quanto aquele empregado pelo iTunes. Precisamos
de algo como moedas digitais ou um sistema semelhante a um bilhete único ou uma
carteira eletrônica – um sistema de interface extremamente simples que permita,
por meio de um clique, as aquisições casuais de jornais, revistas, artigos,
acesso a blogs ou vídeos, ao preço de US$ 0,05, US$ 0,10, US$ 0,50 ou seja
quanto for que o seu autor deseje cobrar.

 

É verdade
que faz 15 anos que a internet está repleta de empresas de micropagamento
falidas. Quem se lembra dos nomes de empresas como Flooz, Beenz, CyberCash,
Bitpass, Peppercoin e DigiCash? Quase ninguém. Muito já se escreveu a respeito
da impossibilidade desse conceito funcionar por causa dos custos da má
tecnologia e da transação mental.

 

Mas as
coisas mudaram. "Com os jornais entrando em situação falimentar mesmo enquanto
seu público leitor aumenta, a ameaça não atinge apenas as empresas donas dos
jornais, mas também a própria notícia", escreveu no mês passado o sensato
colunista do New York Times David Carr num texto que defendia a ideia do
conteúdo pago. Isso cria uma necessidade que pode se tornar a mãe da invenção.

 

Além disso,
dois dos nossos mais criativos inventores digitais mostraram que um modelo
pague-conforme-o-uso pode dar certo quando seu funcionamento é suficientemente
facilitado: Steve Jobs conseguiu fazer com que os consumidores de música
(possivelmente os mais relutantes de todos) aceitassem a ideia de pagar US$ 0,99
por música ao invés de assassinar a indústria por meio do compartilhamento de
arquivos, e Jeff Bezos mostrou, com o seu Kindle, que os consumidores estão
dispostos a adquirir versões eletrônicas de livros, revistas e jornais se o
sistema de compra for simples.

 

Quais são
as opções de pagamento eletrônico disponíveis atualmente? A PayPal é a mais
famosa delas, mas o seu funcionamento é desajeitado e os seus custos por
transação são altos demais para compras impulsivas de valor inferior a um dólar.
Os usuários do Facebook estão adotando sistemas como o Spare Change, que permite
a eles utilizar suas contas do serviço PayPal e os seus cartões de crédito para
obter dinheiro digital que pode ser gasto em pequenas quantidades. Entre os
serviços similares estão o Bee-Tokens e o Tipjoy. Usuários do Twitter têm o
Twitpay, que é um serviço de micropagamento para o aplicativo de micromensagens.
Os apreciadores de jogos eletrônicos têm sua própria moeda digital que pode ser
usada nas compras impulsivas feitas durante as seções de jogos estilo RPG
online. PaymentOne e Paymo estão tentando viabilizar um sistema de
micropagamento no qual a despesa seja cobrada na conta telefônica. E aqueles que
estão acostumados a utilizar sistemas de transporte para ir e vir do trabalho
estão acostumados com artefatos como o E-ZPass (semelhante ao Bilhete Único e ao
Sem Parar empregado nos pedágios brasileiros), que são debitados automaticamente
quando o usuário passa por uma cabine de pedágio na rodovia.

 

Se eu fosse
o administrador do New York Times, do Wall Street Journal ou do Los Angeles
Times, assumiria a vanguarda ao criar meu próprio sistema de troco digital ou
Bilhete Único de micropagamento e tentaria fazer com que outros criadores de
conteúdo utilizassem o mesmo sistema.

 

Ou então
tentaria trabalhar com uma empresa como Amazon, PayPal, Google, Apple ou
Microsoft numa parceria com o objetivo de criar um tal sistema. Eu começaria ao
mesmo tempo a aceitar os melhores sistemas de micropagamento existentes. Assim
como as lojas aceitam diferentes cartões de crédito, os sites deveriam aceitar
diferentes sistemas de micropagamento.

 

O sistema
ideal de micropagamento seria tão fácil de usar que o internauta mal pensaria
antes de efetuar uma compra impulsiva. Não vejo necessidade de uma cobrança item
por item. Na verdade, a ausência de cobranças individualizadas circulando por aí
seria especialmente atraente para aqueles que adquirem coisas um pouco mais
extravagantes do que o Wall Street Journal. Aqueles que desejassem uma cobrança
individualizada poderiam fazer uso de um serviço pago para tal finalidade.

 

Dentro de
um sistema de micropagamento, um jornal poderia decidir cobrar US$ 0,10 por um
artigo ou US$ 0,50 pela íntegra da edição do dia ou US$ 2 por um mês de acesso
ao conteúdo disponível por meio da internet. Alguns internautas poderiam se
recusar a pagar o preço, mas acredito que a maioria deles aceitaria a cobrança
se o valor fosse baixo e o processo, simples. Os assinantes da versão física do
jornal poderiam acessar a versão eletrônica de graça. É claro que não deve haver
conluio entre as empresas de mídia e os concorrentes devem ter a liberdade de
cobrar o preço que quiserem, ou mesmo de não cobrar nada.

 

O sistema
poderia ser empregado para todos os tipos de mídia: revistas e blogs, jogos e
aplicativos, transmissões televisivas e vídeos amadores, imagens pornográficas e
monografias programáticas, reportagens de cidadãos jornalistas, receitas de
grandes chefs e músicas de bandas alternativas. Isso não apenas garantiria a
sobrevivência das formas tradicionais de veiculação de mídia como também
estimularia os cidadãos jornalistas e os blogueiros. Eles enriqueceram muito o
nosso universo de informações e ideias, mas a maioria deles não ganha muito
dinheiro com isso. Como resultado, tendem a insistir na atividade para
satisfazer o próprio ego ou como forma de cumprir algum dever cívico e costumam
vir da elite privilegiada. Um sistema de micropagamento permitiria que as
pessoas normais, do tipo que precisa se preocupar em sustentar a família e pagar
as contas, complementassem sua renda por meio do jornalismo cidadão, um trabalho
valorizado pela comunidade.

 

Cobrar pelo
conteúdo é apenas uma das muitas opções que podem desempenhar um papel no
sustento de um conjunto diverso de mídias nesse país. Muitos jornais e revistas
– e blogueiros e cidadãos jornalistas – decidiriam pela manutenção da sua
gratuidade, ou poderiam depender de um sistema de gorjetas para doações
voluntárias, ou do subsídio de organizações de interesse público ou
proprietários ricos. Acho ótimo.

 

Quanto
maior o número de modelos comerciais concorrentes, mais saudável será a
composição de mídias e veículos diferentes.

 

Mas um
sistema de micropagamento também ofereceria uma outra opção.

 

Jornais que
avaliassem o valor da sua produção diária na casa de US$ 0,10 – e cujos leitores
concordassem com este valor – poderiam acabar cobrando US$ 0,10, aumentando
assim sua chance de sobreviver e até de prosperar. As pessoas trabalhando num
jornal como esse sairiam de suas camas todos os dias motivadas pelo digno
incentivo de produzir um jornal que os leitores considerassem valer ao menos US$
0,10.

 

Aqueles que
acreditam que todo o conteúdo deve ser gratuito devem refletir sobre quem
abriria sucursais em Bagdá ou voaria até Ruanda para trabalhar como freelance
dentro de um tal sistema.

 

Durante as
últimas semanas, por exemplo, estive muito interessado nos acontecimentos na
Faixa de Gaza e como esses afetariam o status do Hamas. Procurei as reportagens
inteligentes e matizadas de Ethan Bronner, do New York Times, de Griff Witte e
Jonathan Finer, do Washington Post, e de Ashraf Khalil, do Los Angeles Times.
Todos eles são muito informados sobre a região. Têm a coragem e a engenhosidade
de chegar até a Cidade de Gaza e as muitas vilas mais ao sul. Eu valorizo isso
enquanto leitor e acredito que o mundo como um todo valorize o fato de os seus
jornais estarem dispostos a pagar seus salários e suas despesas – e contarem com
os recursos necessários para tal finalidade – para que eles possam satisfazer
nosso desejo por informação independente.

 

Assim,
espero que 2009 seja o ano em que alguns bons jornais e outros criadores de
conteúdo valioso comecem a cobrar pelo acesso ao mesmo.

 

Digo isso
não porque sou "malvado" – a descrição que minha filha emprega contra aqueles
que desejam cobrar pelo conteúdo na rede, pelas músicas e pelos aplicativos. Ao
contrário, digo isso porque minha filha é muito criativa, e quando ficar mais
velha, quero que ela ganhe dinheiro produzindo coisas realmente interessantes em
vez de me procurar em busca de dinheiro ou decidir que faz mais sentido virar
uma investidora financeira.

 

Também digo
isso porque amo o jornalismo. Acredito no seu valor para a sociedade e acho que
ele deve ser valorizado pelos seus consumidores. Acho que precisamos dele para
preservar a saúde das nossas comunidades locais, da nossa democracia nacional e
do nosso mundo.

 

Nessa nova
era digital, a definição do jornalismo está mudando. Não se trata mais de algo
que é escrito na pedra e concedido ao público pelos altos sacerdotes da
profissão e pelas principais empresas de mídia. Ele pode assumir formas que
sejam, felizmente, mais pessoais e opinativas e cheias de atitude. O jornalismo
tem a habilidade de ser mais interativo, colaborativo, "wikipédico", produzido
pelos leitores e de borrar a distinção entre o jornalista sagrado e o cidadão
consumidor.

 

Mas certas
características definidoras do jornalismo não deveriam ser mudadas. Esses
valores centrais permanecem no núcleo do jornalismo do qual nós necessitamos
enquanto comunidade humana. O jornalismo precisa tentar preservar sua
credibilidade. Seus praticantes precisam ter a mente aberta e ser honestos
conforme reúnem e transmitem informações, seja da Faixa de Gaza ou da prefeitura
local. Nós, leitores e consumidores, precisamos poder confiar neles – precisamos
saber que eles estão tentando servir a nós e não a algum objetivo secreto. Eles
precisam ter como objetivo a verdade. "A ideia de que haja algo como a verdade
foi muito mal falada nos últimos 30 anos", disse Kurt Andersen na conferência
realizada no Instituto Aspen no último verão, "mas ainda acho que a busca pela
verdade é aquilo que deve mover os jornalistas".

 

Por quê?
Porque o verdadeiro objetivo do bom jornalismo deve ser o serviço ao leitor.

 

O que me
traz de volta à minha esperança de que este seja o ano no qual os
micropagamentos se tornarão aceitos e os leitores começarão a pagar pelo
jornalismo que desejam. Assim, os jornalistas se sentirão dependentes
principalmente dos seus leitores, em vez de procurar cada vez mais agradar aos
anunciantes e contemplar outros objetivos. A cobrança pelo conteúdo obriga os
jornalistas a manter a disciplina: eles precisam produzir material que as
pessoas de fato considerem valioso. Suspeito que afinal descobriremos o caráter
libertador desta obrigação. A necessidade de ser valorizada pelo público –
servir a ele antes de mais nada, sem depender unicamente da renda publicitária –
permitirá à mídia orientar-se novamente pelos princípios originais do
jornalismo.

 

*O autor
foi editor da revista Time e atualmente é presidente do Instituto Aspen.
Publicou recentemente "Einstein: sua vida e seu


universo". Este artigo é baseado em palestra do autor na Universidade de
Riverside Califórnia. A publicação foi autorizada pelo Instituto Aspen.

Categorias: Jornalismo

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