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O Estado de São Paulo, TV & LAZER , Domingo, 15 abril de
2007


“Continuo sendo
jornalista”-

 entrevista com Ana Paula Padrão

Ela abriu mão da exposição
diária em troca de qualidade de vida. Coisa de mulherzinha? Não, de macho

RENATA GALLO

Frei Galvão está ali. Nas imagens espalhadas pela
capela, nos santinhos vendidos na lojinha, nas pílulas embrulhadas em pedacinhos
de papéis e até personificado como estátua viva. Tudo no Mosteiro da Luz exala
frei Galvão. E foi ali, sentada nos bancos do jardim do mosteiro, depois de
gravar um programa especial para o seu SBT Realidade, que Ana Paula Padrão
conversou com o Estado.

A jornalista falou sobre seu novo trabalho e sua nova
vida. E frei Galvão, homem que é, não deve ter entendido nada. Nenhum homem, por
mais santo (ou prestes a se tornar um) que seja, entenderia. Como uma pessoa
canaliza toda sua vida para uma coisa e muda de idéia? Como uma pessoa larga a
bancada de um dos principais jornais da principal emissora do País só para poder
ir dormir e acordar ao lado do marido? Querer viver um amor permanente, cultivar
os amigos… Eita coisa de mulherzinha. Não, isso é coisa de macho, muito macho.
E, pelo que eu vi, as coisas não devem parar por aí. Frei, ela saiu com um
envelope lotado com suas pílulas. Juro que vi.

Com saudade da hard news?

Achei que ia ter, mas os benefícios da minha atual
rotina são tão maiores que em nenhuma destas crises tive saudade. Porque é claro
que, se acontecer um factual que se imponha, vou fazer a cobertura. Continuo
sendo jornalista, continuo ligada ao factual, mas tenho mais tempo.

Você tinha alguma ilusão em relação ao SBT e se
frustrou de alguma forma?

Não. A minha relação com o Silvio é uma relação muito
boa. Quando apresentei a ele o SBT Realidade a única pergunta que ele fez foi:
‘Você realmente quer deixar de aparecer todo dia e aparecer uma vez por semana?’
Acho que todo lugar que você trabalha tem a sua particularidade, suas
esquisitices. E você tem que se adaptar. Não senti muito esse negócio de mudança
da grade porque meu contrato tinha restrição. O horário muda mesmo, o Jornal da
Globo entrava ao ar às 11h15 (da noite) um dia e à 1 da manhã no outro. Trabalho
é tudo igual.

Você era um exemplo de mulher moderna e optou por sua
vida particular, como o público reagiu?

Você não imagina a quantidade de mulheres que disseram
para mim: ‘Isso mesmo. É um saco este negócio de só ter que trabalhar’. Porque,
naturalmente, você acaba abrindo mão de tudo. Sou da geração dos anos 80, quando
para entrar no mercado de trabalho você tinha que virar um homenzinho, era
difícil ser respeitada principalmente se você não tivesse uma cara muito feia.
Dizer: ‘Pôxa, meu marido está doente’. Ou: ‘Estou com cólica, triste’. Ahhh,
chorar em ambiente de trabalho era im-pen-sá-vel.

Você se moldou a este modelo?

Claro, usava ombreiras enooormes! (risos) A minha
geração cresceu ouvindo das mães: ‘Não dependa de homem’. Era um mantra. E fiz
isso, mas acho que quando você chega em determinada idade você começa a
vislumbrar a velhice, pensa: ‘Vou olhar para trás e vou ter construído o quê?’
Porque emprego é isso: você está um dia em um e outro dia em outro. Para mim
isto bateu quando me casei, aos 37 (Ana está com 41 anos). Comecei a pensar:
‘Tenho uma carreira legal, mas o que vou ter aos 60 anos?’ Sei que não vão se
lembrar de mim. Você é lembrada quando está permanentemente na mídia. E aí? Ia
ter que me expor diariamente até meus 60 anos? E começar a puxar a carinha? Não
quero.

E o que quer?

Quero viver um amor permanente, quero construir algo
sólido, quero cultivar meus amigos… (pausa) É triste você ver um amigo passar
por uma situação difícil ou ter um momento de alegria e não estar presente.
Passou, você não viu, não cumprimentou, não deu um abraço. E daí você começa a
pensar se vale a pena. Olha, não quero me esticar toda. Sou supervaidosa, uso
creminho para a área dos olhos, mas quero ter a idade que tenho e parecer ter a
idade que tenho. Não quero me casar com um menino de 18 anos quando tiver 60
para me sentir jovem.

O seu contrato com o SBT falava que você teria o
papel de reestruturar a redação da emissora.

Na verdade, para fazer um jornal precisava fazer tudo.
Havia um jornal gravado indo ao ar de madrugada e uma equipe minúscula. Foi um
grande aprendizado. Hoje conheço muito mais do funcionamento de uma redação, de
uma TV. Acho que hoje o SBT tem um parque técnico infinitamente melhor.

Mas você é jornalista. Acha satisfatório o que vai ao
ar no SBT?

Vou ser honesta, nunca vi. E não vi para nunca ter que
responder a esta pergunta porque ela não me cabe. Não seria elegante. Nunca
assisti nada que deixei de fazer.

Uma vez você disse que era uma pessoa angustiada,
sente-se hoje uma pessoa mais leve?

Infinitamente. As pessoas me dizem: ‘Nossa, como está
mais bonita, mais soltinha!’ É engraçado, só consigo perceber se estou feliz ou
triste quando olho o passado e, quando olho para a época do Jornal da Globo,
penso: ‘Como estava virando uma pessoa carrancudinha!’ Você começa a abrir uma
concessão aqui, outra ali… E eu não via meu marido. E quem vai envelhecer
comigo: esta bancada ou este homem? A minha carreira é esta bancada ou é tudo
que eu fiz até agora e posso fazer em outro lugar? É difícil falar disso porque
muita gente pode falar que sou uma derrotada, que larguei aquela bancada
maravilhooosa. É difícil as pessoas entenderem porque todo mundo quer os seus 15
minutos de fama e ninguém abre mão disso. Eu abri.

Sofreria em viver no anonimato? Hoje uma irmã te
chamou de Eliana, a outra de Ana Maria…

(risos) Elas vivem na clausura. Acho que sou muito mais
conhecida do que gostaria. Muita gente me chama de Ana Maria e isso não é o
importante, é efêmero. As pessoas não têm obrigação de saber seu nome, quem você
é.

Mas quando sabem isso infla o ego, não?

Um monte de gente me chama de Ana Paula Padrão, enfim,
você não faz para os outros, faz porque gosta. É a mesma coisa do botox. Você
faz botox porque acha que envelheceu mais depressa que seu espírito ou porque se
não fizer não vão te querer mais? O que tenho hoje é mais importante do que
qualquer coisa. O meu caminho natural, montando uma produtora, está cada vez
mais atrás das câmeras. E isso tem uma conseqüência: ficarei menos conhecida.
Daqui a 20 anos, aconteça o que acontecer, não se lembrarão de mim porque não
vou colocar botox, nem silicone e não vou levantar a bundinha.

Demorou quanto tempo para esta conclusão?

(risos) Ah, 10 anos de análise! Não é fácil, mexe com o
ego. Mas fico pensando nos 60. Tenho que fazer alguma coisa para chegar lá bem,
intelectualmente falando. O que vai contar não é a minha carinha, mas minha
cabecinha.

O trabalho é a coisa mais importante da sua vida?

Já foi e por muitos anos. Hoje o trabalho é 40% da minha
vida, mas, se tiver que parar, sobrevivo. Vou fazer crochê. Adoro decoração,
bordo casacos, faço patchwork. É claro que se tivesse que fazer isso para o
resto da vida ficaria entediada, mas posso inventar outra coisa.

Categorias: Jornalismo

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