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> Agência Estado,
20/06/2009 – São Paulo SP


Jornalista sem diploma

Finalmente, depois de
anos de polêmica, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu solução definitiva à
questão da obrigatoriedade do certificado de conclusão de uma faculdade de
comunicação social para exercer a atividade de jornalista. Por 8 votos a 1 o
STF decidiu que o Decreto-Lei 972 de 1969, que exigia tal condição, é
incompatível com a Constituição de 1988, justamente porque esta garante a
plena liberdade de expressão e comunicação. "O jornalismo e a liberdade de
expressão são atividades que estão imbricadas por sua própria natureza e não
podem ser pensados e tratados de forma separada. O jornalismo é a própria
manifestação e difusão do pensamento e da informação." Com estas palavras, o
ministro Gilmar Mendes associou liberdade de expressão e comunicação que a
Constituição assegura em alguns de seus dispositivos – com ênfase típica de
uma sociedade que já sofreu a censura de um regime autoritário – ao
exercício da atividade jornalística sem quaisquer formas de controle,
restrição ou condição imposta pelo Estado. Sem dúvida essa associação se
harmoniza com o principio básico que rege a liberdade de imprensa nas
democracias contemporâneas, bem ilustrada pela interpretação que a Suprema
Corte deu, na década de 1970, à Primeira Emenda da Constituição
norte-americana – a que primeiro institucionalizou essa liberdade. Disse a
Suprema Corte que o maior bem a ser tutelado não é o direito do jornalista
de informar, mas sim o da sociedade de ser informada.

O ministro Mendes
relatou o processo que chegou ao Supremo em 2006 e no qual já dera, na
ocasião, liminar suspendendo a exigência do diploma. Esse processo se
originara de ação contra a obrigatoriedade do diploma, proposta pelo
Ministério Público Federal e pelo Sindicato das Empresas de Rádio e
Televisão de São Paulo. Em 2001, a 16ª Vara de São Paulo extinguira a
exigência, mas em 2003 o Tribunal Regional Federal da 3ª Região a
restabelecera. Ao relatar o processo na quarta-feira o presidente do Supremo
disse: "Um excelente chefe de cozinha certamente poderá ser formado numa
faculdade de culinária, o que não legitima o Estado a exigir que toda e
qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de
curso superior nessa área." O ministro também se referiu ao fato de as
faculdades que formam jornalistas não perderem importância, uma vez que os
veículos de comunicação têm a plena liberdade de exigir o diploma para
aceitar profissionais em seus quadros. De nossa parte, preferimos dizer que
as faculdades de comunicação serão importantes pela qualidade do ensino que
ministrarão aos futuros profissionais do jornalismo – e decerto terão de se
aprimorar, porque seus alunos sofrerão, no mercado de trabalho, a
concorrência que vem com o fim da reserva de mercado. Se a exigência do
diploma, estabelecida no decreto-lei do regime militar, já era um
anacronismo quando foi criada, de lá para cá a evolução tecnológica da
comunicação a deixou ainda

mais despropositada e
inteiramente inócua. Com o desenvolvimento da internet, em que qualquer
pessoa pode criar e desenvolver o seu blog, arregimentando uma quantidade
literalmente incalculável de leitores, qualquer um pode transmitir
informações e opiniões – exercendo, desse modo, ainda que sem os rígidos
princípios éticos adotados pelas empresas de comunicação que se pautam pela
seriedade e pela responsabilidade, uma típica atividade jornalística. Não
haveria condição alguma de exigir-se prova de conclusão de curso específico
para esse trabalho. As entidades de jornalistas que defendiam a exigência do
diploma, o que pretendiam era uma restrição de natureza corporativa,
julgando com isso proteger seu mercado de trabalho. Diga-se o mesmo em
relação a alguns donos de escolas de comunicação, que julgavam, ao defender
a obrigatoriedade do diploma, garantir uma clientela compulsória. Ocorre
que, até em termos de mercado de trabalho, essa "reserva de mercado" com
base no diploma é ilusória. Muito mais eficiente que aquela reserva de
mercado, em termos de qualificação do profissional jornalista, será a
concorrência pela qualidade que terá que surgir entre essas escolas. Cada
qual terá que aperfeiçoar ao máximo os seus cursos, buscar o corpo docente
mais bem habilitado e o padrão de ensino mais eficiente, para arregimentar
alunos que queiram disputar empregos nos veículos de comunicação. Os
leitores, sem dúvida, serão os maiores beneficiados.

Categorias: Jornalismo

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