O Novo Ensino Médio

“A Educação no Brasil é, para alguns, mas deveria ser para todos, uma ‘Questão de Estado’, independentemente dos projetos da oposição e do governo”

Cândido Vaccarezza* | Brasil 247**

A Educação no Brasil é, para alguns, mas deveria ser para todos, uma “Questão de Estado”, independentemente dos projetos da oposição e do governo. – A educação é um passaporte para o futuro -. Todo mundo se diz a favor da educação, “como alguém poderia ser contra”?.

Infelizmente, ao examinarmos as questões concretas, os interesses materiais de alguns, as posições políticas e ideológicas de outros se chocam com a educação de qualidade que precisamos oferecer e estamos negando aos nossos jovens. A regulamentação atual do ensino médio contida na LDB (Lei de Diretrizes e Bases), Lei nº 9.394/1996, reformada em 2017 pela Lei nº 13.230/2017 e mesmo o PL 5.230/2023 proposto pelo governo, que está em debate no Congresso Nacional, já aprovado na Câmara e aguardando decisão do Senado, contêm pontos positivos, mas não equacionam o caminho que o Novo Ensino Médio precisa para termos um segundo grau, como chamávamos antigamente, da qualidade e da dimensão das necessidades do Brasil.

Segundo a Agência Gov, em 2023 foram registradas 7,7 milhões de matrículas no ensino médio; de acordo com o censo de 2022, tínhamos quase 10 milhões de analfato totais, pessoas que não conseguem nem ler o título deste artigo; tínhamos em 2023 (Pnad contínua) 29 milhões de jovens de 15 a 29 anos, sem ensino superior completo, que não estudavam, não faziam curso profissionalizante e nem cursavam pré-vestibular; agravando este quadro o Censo escolar mostrou que o ensino médio, é a etapa dos estudos com maior taxa de repetência, 3,9 e de evasão escolar, 5,9; e, ainda, segundo o IBGE, 52 milhões de jovens de 14 a 29 anos não concluíram o ensino médio, isto é quase o total da população da Itália.

O ensino médio no Brasil, faz parte das nossas tragédias; as camadas médias e altas, têm ensino de boa qualidade,equivalente ao ensino de qualquer lugar do mundo, mas em torno de 80% dos jovens que se matricula no ensino médio, o faz na Escola Pública e é aqui o ponto a ser atacado, pois boa parte da nação brasileira estuda na escola pública. Imaginem quanto o Brasil perde por não ter um ensino médio de qualidade. Não adiantam medidas paliativas, projetos que têm como escopo principal reduzir gastos e discursos floreados de boas intenções, mas que não atacam e nem resolvem os problemas centrais. Precisamos de um ensino médio de boa qualidade, em tempo integral, profissionalizante, com professores melhor preparados e com escolas públicas em condições dignas para atender a toda a nossa juventude.

O PL aprovado no formato do substitutivo do relator da Câmara, que obteve uma maioria expressiva, reunindo o governo e boa parte da oposição, incorpora alguns avanços em relação a reforma de 2017, mantendo a sua essência; altera o tempo para formação geral básica, de um teto de 1800 horas para um piso 2400 e mantém o mecanismo para viabilizar os cursos técnicos de 1200 horas. A carga horária e o tempo dos alunos nas escolas dos países desenvolvidos do mundo, é muito maior que a do Brasil. Nos EUA, por exemplo, o ensino médio, denominado de High School, tem a duração de 4 anos, os adolescentes começam as aulas, em geral, às 7h30m e terminam às 14h30, com intervalo para o almoço, mas permanecem na escola para atividades esportivas, culturais e complementares, com variações de Estado para Estado.

O PL discutido no Congresso abre espaço para reconhecimento do ensino médio à distância, o que hoje é apenas uma atividade complementar e mantém a carga horária de 3000 horas efetivadas em 3 anos. O Senado, há pouco mais de um mês, aprovou um PL, que está parado na Câmara, que aumenta o ensino básico para tempo integral e define outras providências, isto terá influência na discussão do PL do governo. Este ano seria ou deveria ser dedicado à discussão do Plano Decenal de Educação, já que há dez anos o Brasil aprovou e, infelizmente, não conseguiu cumprir as metas do Plano Nacional de Educação de 2014. Reconheço os passos para dados para inclusão social e para evitar evasão como a poupança proposta pelo governo para alunos mais pobres, mas medidas como estas não alteram o cerne da questão.

O Senado pode aproveitar o PL 5230/2023 e enriquecê-lo substancialmente. Nós podemos, enquanto aguardamos a discussão do Plano Decenal para a Educação, chamar a atenção dos Senadores para, ao invés de consolidar a figura do professor de notório saber, contemplar um vigoroso plano de qualificação, educação continuada, carreira bem remunerada para valorização dos nossos professores; introduzir a obrigatoriedade da língua espanhola no currículo do ensino médio; complementar as atividades em EAD e novas tecnologias de ensino, com o uso de inteligência artificial e da robótica, e, proibir o curso exclusivo por EAD; desenvolver ainda mais a integração entre o ensino médio e os centros de tecnologia das universidades e, quando for o caso, com os centros de tecnologias empresariais, possibilitando o ensino profissionalizante, mesmo para aqueles alunos que não escolheram uma escola técnica, congraçandos os itinerários formativos com os avanços das novas tecnologias.

Enfim, a bola agora está no Senado e nos diálogos que a sociedade civil pode empreender. Vamos exercer a nossa cidadania.

*Dr. Cândido Vaccarezza é um médico e político formado pela Universidade Federal da Bahia e atualmente mora em São Paulo. Ele tem especializações em ginecologia e obstetrícia, saúde pública e saúde coletiva. Durante a pandemia, foi diretor do Hospital Ignácio P Gouveia, referência para o tratamento de Covid na Zona Leste de São Paulo. Como político, ele participou da luta pela democracia no Brasil na década de 1970 e foi deputado estadual e federal pelo PT. Além disso, ele também foi líder na Câmara do Governo Lula e Dilma e secretário de esporte e cultura em Mauá. Reg

**Brasil 247, https://www.brasil247.com/blog/o-novo-ensino-medio-30v1o9w4, 21/04/2024

 

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