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Revista Isto É, Edição 2033 – 22/10/2008



Medicina & Bem-estar



Os anjos do câncer


Hospitais criam equipes para dar apoio emocional aos pacientes e ajudá-los a
entender e persistir no tratamento

Mônica Tarantino


Um dos grandes desafios de quem recebe a notícia de que tem câncer é superar o
choque e iniciar o tratamento o mais rápido possível. Porém muitas vezes o
paciente e seus familiares ficam com tantas dúvidas sobre o que virá pela frente
que se sentem inseguros para dar os primeiros passos contra a doença. Com a
finalidade de auxiliar nesta etapa tão delicada, alguns hospitais brasileiros
começam a oferecer um novo serviço. Nessas instituições, já se pode ter o apoio
de profissionais especialmente designados para orientar os doentes e seus
acompanhantes. A missão deles é ser um ponto de referência e de apoio desde a
fase de consultas até depois da alta, se o tratamento continuar em casa. Por
isso, poderiam ser chamados de "anjos do câncer".


No Instituto do Câncer de São Paulo foi criada uma equipe de mais de 50 pessoas
incumbida de acolher os pacientes às vésperas da primeira consulta depois do
diagnóstico. O grupo, batizado de Acolhida, é formado por especialistas em
nutrição, farmácia, enfermagem, psicologia e serviço social. Duas vezes por dia,
eles se reúnem em duplas para explicar aos recémchegados rapidamente o
funcionamento do hospital e as etapas do tratamento. Durante esse encontro,
pacientes e familiares se apresentam e são encorajados a falar de si. Muitos se
comovem, rezam, e, no final, agradecem à equipe por se sentirem menos sós e por
ter o nome e o telefone de alguém do hospital a quem podem procurar para tirar
as muitas dúvidas que já trazem. "As pessoas chegam fragilizadas. Precisam expor
suas angústias, receber informação e apoio", explica a psicóloga Eliana Ribas,
coordenadora do Programa de Humanização do hospital.



O Hospital do Câncer A.C.Camargo, também em São Paulo, fez uma opção diferente.
Ali, a função de dar suporte emocional e prático aos pacientes é
responsabilidade das enfermeiras de cada andar, que são conhecidas como tutoras.

Nesse modelo, cada "tutora" acompanha quatro a cinco pacientes durante a
internação para conhecer os detalhes do caso e dar as orientações de que a
família precisa. No momento da alta, elas ensinam aos familiares o modo correto
de lidar com as medicações, cateteres e sondas. Outra de suas funções é
telefonar regularmente para monitorar o estado do paciente em casa. "Temºos uma
lista de perguntas para avaliar se ele está bem. Os familiares ficam gratos e
tranqüilos com esse apoio", diz a enfermeiratutora Juliana Passoni, 23 anos.


Foi em uma dessas ligações que ela percebeu a necessidade de pedir ao contador
Luciano Ribeiro, 32 anos, que voltasse a se internar para cuidar dos efeitos
colaterais intensos da quimioterapia. "A Juliana é nosso anjo da guarda. É a
primeira vez que me sinto tão cercado de atenção e cuidado", diz Luciano, que
trata a volta de um tumor de aparelho digestivo. Um dos resultados concretos do
programa de apoio, criado há cinco meses, é a redução no número de visitas ao
prontoatendimento para tirar dúvidas sobre medicações e efeitos colaterais da
quimio e radioterapia.


Nos Estados Unidos, há redes desse tipo em funcionamento em renomadas
instituições como o M.D.Anderson Cancer Center. Também existem profissionais de
saúde autônomos ou voluntários treinados que podem ser contratados pelo
paciente. Conhecidos por treinadores ou navegadores (do inglês coach e navigator,
respectivamente), eles ajudam os doentes a tomar decisões e dão conselhos. A
enfermeira americana Erin Sommerville, por exemplo, atua nessa área há 14 anos e
apresenta seus serviços em um site na internet. "Ajudo pessoas com diferentes
diagnósticos e em vários estágios de doença a tomar as decisões que precisam e a
melhorar sua qualidade de vida. É um trabalho intenso, que exige muito preparo",
disse Erin à ISTOÉ. Diante da grande procura por pessoas como Erin, que tem um
certificado específico para atuar na área, a própria Sociedade Americana de
Câncer começou a dar cursos para formar mais profissionais. A demanda por essa
ajuda qualificada tem sido tão grande que diversas indústrias farmacêuticas já
estão subsidiando os cursos de treinamento.


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