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O Estado de São
Paulo,
03 de abril de 2010 | 0h 00


Os cursos da USP Leste

Formandos das primeiras turmas de graduação da
USP Leste enfrentam problemas para trabalhar nas áreas de especialização em que
se formaram. Alguns dos cursos oferecidos pela instituição ? interdisciplinares
e destinados a profissões novas, surgidas com o avanço da tecnologia ? concedem
diplomas que ainda não são reconhecidos por conselhos profissionais e por
sociedades científicas. Além disso, não há vagas na iniciativa privada e no
setor público para esses profissionais.

Os casos mais graves são os dos cursos de
Obstetrícia e Gerontologia. O primeiro forma especialistas capazes de "cuidar da
saúde de gestantes, parturientes, puérperas, recém-nascidos e familiares". O
segundo se destina a formar profissionais capazes de gerenciar políticas
públicas e projetos de qualidade de vida na terceira idade. Como o Conselho
Regional de Enfermagem e a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia não
reconhecem os diplomas expedidos pela USP Leste, os formandos correm o risco de
ser processados por exercício ilegal da profissão.

Por isso, dos 200 alunos formados por esses
cursos, vários decidiram adiar o ingresso no mercado de trabalho, ficando à
espera de uma solução para o problema. Outros optaram por uma área distinta da
formação superior recebida. Só alguns poucos bacharéis que ingressaram na
Justiça com pedido de liminar conseguiram obter registro provisório e estão
autorizados a trabalhar como obstetras e gerontólogos.

Alguns professores da USP Leste alegam que os
cursos da instituição foram criados a partir de especialidades oferecidas por
mestrados e doutorados para enfermeiros, médicos e profissionais de saúde ?
categorias estabelecidas, fiscalizadas e reconhecidas por conselhos
profissionais. O problema é que, nos casos de Obstetrícia e Gerontologia, os
conselhos ainda não foram instituídos. Outros professores alegam que, se as
instituições de ensino superior tiverem de oferecer apenas cursos de graduação
que os conselhos profissionais e as sociedades científicas reconhecem, elas não
conseguirão fazer pesquisas de ponta, alargar as fronteiras do conhecimento e
abrir caminho para novas profissões. Na definição das prioridades da
Universidade, em outras palavras, o que deveria prevalecer são os conselhos
estaduais e nacional de educação e não os conselhos profissionais.

Os argumentos são convincentes, mas a origem do
problema está no modo como a USP Leste foi concebida e implantada. Os
responsáveis pelo projeto, entusiasmados com inovações pontuais produzidas nos
currículos das universidades federais na primeira gestão do presidente Lula,
deixaram-se levar por modismos pedagógicos e estratégias de marketing. Com isso,
em vez de se concentrar nas áreas tradicionais do conhecimento, eles acabaram
oferecendo apenas cursos técnicos, como sistemas de informação, gestão
ambiental, políticas públicas, obstetrícia e gerontologia, sob a justificativa
de que isso permitiria aos alunos oriundos da região, uma das mais pobres da
Grande São Paulo, ingressar rapidamente no mercado de trabalho. A criação de um
novo campus da USP numa área carente foi uma iniciativa importante, pois ajuda a
democratizar o acesso ao ensino superior público. Mas o projeto da USP Leste
acabou sendo tocado às pressas pelo então governador Geraldo Alckmin, para
servir de bandeira política na eleição de 2006.

Tanto açodamento não permitiu, por exemplo, que
a USP revogasse um discutível dispositivo de seu regimento, que proíbe a
duplicação, na capital, dos cursos de medicina, engenharia ou economia. Esses
cursos, seguramente, dariam melhor preparo aos alunos da zona leste, dando-lhes
com isso a condição de ingresso no mercado de trabalho que os cursos técnicos
não conseguem assegurar.

É por isso que, no início do ano, alguns
docentes lançaram a tese de que a USP Leste deveria ser repensada. A proposta,
como era de esperar, sofreu fortes críticas dos diretores dos cursos da
instituição. As dificuldades que os formandos estão enfrentando para obter
registro profissional mostram que há algo de errado.


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