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> Folha de São Paulo, 25/06/2009 – São Paulo SP



Ser ou não ser (diplomado), eis a questão


Cumpre agora esperar por legislação específica do Congresso, a quem cabe
estabelecer requisitos para o exercício das profissões


JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO


NÃO, O diploma dos jornalistas não acabou. A decisão do Supremo Tribunal
Federal, na última semana, limitou-se a dizer que o decreto-lei 972/69 era
incompatível com a Constituição democrática de 1988. Mais nada. E merece
elogios -por pretender, esse monstrengo da redentora, exercer o controle do
jornalismo a partir do Estado. Era nele que estava, em regra acessória
(artigo 4º, V), a exigência de diploma para registro dos jornalistas no
Ministério do Trabalho. Ocorre que, tecnicamente, jamais poderia o STF
declarar sem valor o decreto-lei e deixar vigendo uma de suas regras. Sem
juízo de valor, no julgamento, sobre o dito diploma -que poderá voltar a ser
exigido em outra lei. Apenas isso.

 


O mais são palavras ao vento. Inclusive as do eminente presidente Gilmar
Mendes, que, mais uma vez, expressa opinião pessoal sobre tema que pode vir
a ser discutido no Supremo -em vez da reserva que, como regra, a seus
ministros conviria guardar em situações assim. Isso posto, cabe então
perguntar se, afinal, esse diploma é bom ou ruim para a cidadania. Não há
consenso. Divididos, os países, em três posições. Primeiro grupo, o dos que
exigem diploma: Bélgica, África do Sul, Arábia Saudita e mais 11 pequenos.
Segundo grupo, o dos que não aceitam nenhum tipo de limitação ao exercício
da profissão: Chile, Áustria e Suíça, na linha de "um modelo de
desregulamentação" absoluto, como defendido pelo ministro Gilmar Mendes.
Duas visões francamente minoritárias, pois. Havendo ainda um terceiro grupo,


bem mais amplo, dos países que admitem algum tipo de exigência prévia para o
exercício da profissão, segundo padrões culturais não uniformes: idade
mínima, escolaridade, ausência de condenação penal, algum curso médio ou
superior, curso preparatório específico, estágios compulsórios. Esse
panorama considera só a base legal; um diploma, no mundo real, significa
maiores chances de obter emprego e/ou salário melhor. Na Alemanha, por
exemplo, quase nenhum jornal importante contrata quem não tem diploma. Nos
Estados Unidos, onde ele também não é exigido, há 400 faculdades, 120 cursos
de pós-graduação e 35 doutorados; sem contar que, na média, 80% das Redações
são compostas por diplomados.

 


Maior diferença, entre Redações brasileiras e estrangeiras, é precisamente a
quantidade de jornalistas com cabelos brancos: abundantes, nas democracias
consolidadas, e escassos, no Brasil, pelo uso indiscriminado de estagiários,
lumpens na profissão, mão de obra jovem e barata. Mas por que jornais, em
regra, tanto querem jornalistas diplomados? A resposta é simples. Por ser
dispendioso ensinar, dentro das Redações, a fazer um jornal. E também porque
jornalistas aprendem, nas universidades, que errar custa caro. Nos Estados
Unidos, com vitória dos demandantes em 75% dos casos, a média das
indenizações oscila entre US$ 100 mil e US$ 200 mil dólares. Com frequência,
vai muito além disso. Por exemplo: Leonard Ross x "New York Times", US$ 7,5


milhões; Richard Sprague x "Philadelfia Inquirer", US$ 34 milhões; Victor
Feazel x Dallas Television Station, US$ 58 milhões; "Wall Street Journal" x
Money Management Analytical Research, US$ 222,7 milhões.


Dando-se então que jornalistas formados, por estatisticamente errar menos,
valem mais. E ganham bem mais também, claro. Desde que haja leis de imprensa
decentes, faltou dizer. O que nunca tivemos -e continuamos sem ter.

 


Posta a questão em tons técnicos e mais serenos, o que se vê hoje em nosso
país é um cenário anormal. Exótico. Porque, em toda parte, são os próprios
jornalistas que não aceitam a exigência do diploma, enquanto aqui sua defesa
é feita pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas). E empresas sempre
pedem diploma -enquanto aqui as restrições contra ele partem de um de nossos
mais respeitados jornais, a Folha de S.Paulo. Coisas do Brasil. Dando os
trâmites por findos, assim, cumpre agora esperar por legislação específica
do Congresso Nacional -a quem cabe, com mais propriedade e mais
legitimidade, estabelecer requisitos para o exercício das profissões. A ele
cumprindo, afinal, decidir se o diploma deve ser mesmo exigido. Ou não. JOSÉ
PAULO CAVALCANTI FILHO, 61, é advogado, pós-graduado pela Universidade
Harvard (EUA). Foi presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica) e da Empresa Brasileira de Notícias, além de secretário-geral do
Ministério da Justiça (governo Sarney).

Categorias: Jornalismo

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