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Folha de São Paulo, Dinheiro, domingo, 26 de abril de 2009


Varejo cria "Big Brother" para decifrar hábitos
do consumidor

Pesquisas e filmagens nas gôndolas ajudam redes a influenciar compras

CRISTIANE BARBIERI, DA REPORTAGEM LOCAL

Basta dar um número no caixa, na hora de pagar. Com ele, o varejista sabe
se o consumidor é vegetariano ou fã de churrasco, se tem preocupações saudáveis
e a quantas baladas vai num mês. Também sabe sua idade, estado civil, a
frequência e em qual bairro faz compras e quanto gasta em média.

Além disso, muitas vezes, os lojistas monitoram esse consumidor em
pesquisas e filmagens na gôndola. O objetivo é tentar entender o que o leva a
tomar determinada decisão de compra e a influenciá-lo na escolha, por meio da
comunicação. Essas filmagens demonstraram que o consumidor gasta entre 4
segundos e 6,5 segundos para decidir o que comprar.

"Nós monitoramos esses segundos", afirma Rui Piranda, vice-presidente da
agência Giovanni+Draft FCB, responsável pela implantação do Cartão Mais, do Pão
de Açúcar, o maior programa de relacionamento desse mercado.

Por trás desse quase "Big Brother" do varejo está, é claro, a busca por
vendas maiores. Nas filmagens de consumidores, por exemplo, o Pão de Açúcar
descobriu que gôndolas na diagonal, em vez das tradicionais paralelas, aumentam
o campo de visão do consumidor. Com isso, ele se lembra de mais produtos que
faltam em casa.

Já o trabalho de inteligência competitiva, como é chamado o uso das
informações fornecidas pelos consumidores a cada compra, fez com que cada
cliente Mais aumentasse seus gastos médios em 3%. Há casos em que o valor das
compras foram multiplicados por dez.

Além disso, os donos do cartão Mais já gastam entre 2,4 e 2,6 vezes mais do
que os clientes tradicionais. As informações são tão detalhadas que o Pão de
Açúcar segmentou-os em 11 perfis. Entre eles, estão os saudáveis, os festas, os
gourmet e os modernos.

"Fazemos ações coerentes com o perfil de cada um deles, para influenciar o
comportamento desse consumidor", afirma Cristina Serra, diretora de marketing do
grupo.

Após anos se perguntando para que servia o Cartão Mais, os clientes do Pão
de Açúcar viram o programa entrar em nova fase. Depois de dois anos de teste, a
rede estendeu o formato a todo o Estado de São Paulo no início do ano. Até
julho, pretende levá-lo a todo o país.

Em troca de suas informações, o consumidor ganha pontos conversíveis em
vales-compras, descontos e promoções feitas sob medida para seu perfil. Cada
real gasto significa um ponto. Somados, 3.000 pontos viram vales de R$ 20; 6.000
pontos, de R$ 50; e 9.000 pontos se tornam R$ 100. O passivo é contabilizado
pela rede.

Por enquanto, entretanto, o consumidor tem de resgatar os pontos por
telefone ou pelo site. "No futuro, os vales-compras aparecerão no caixa, na hora
em que o consumidor se identificar", diz Serra.

Riscos

Apesar de o relacionamento com o consumidor oferecer possibilidade de
vendas maiores, sua gestão não é simples e os investimentos são altos. Segundo
especialistas, o próprio Pão de Açúcar correu riscos.

"Quando a empresa coleta dados e aborda as pessoas na gôndola, ela cria
expectativas", afirma Renato Borgheresi, coordenador da pós-graduação em
inteligência de mercado da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

Outra ameaça, é claro, é o consumidor se sentir invadido pelo monitoramento
constante. Em 2002, o Ministério Público entrou na Justiça contra a rede,
impedindo-a de usar as informações coletadas. Na nova fase, o Pão de Açúcar
pergunta se o consumidor quer receber ofertas. Dos 2 milhões de cartões em
vigor, 93% aceitam que suas informações sejam usadas, desde que tenham um
benefício tangível.

Categorias: Marketing

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