‘Workation’: conheça a tendência que une viagem de lazer ao trabalho adotada por algumas empresas no Brasil
Benefício permite que os profissionais atuem remotamente de qualquer lugar do mundo, por um determinado período de tempo e com a possibilidade de adaptar a jornada ao fuso horário do país de destino.
Por Rafaela Zem, g1*
Giovana Gabriel foi convidada para passar as férias na casa de uma amiga, na Noruega, país localizado no norte da Europa. A viagem iria durar 15 dias, mas, graças ao “workation”, a jovem conseguiu esticar o roteiro e ficou por mais 30 dias na Espanha. Tudo isso sem pedir afastamento ou folga do trabalho.
O “workation”, termo criado a partir da junção das palavras work e vacation (trabalho e férias em inglês), é um benefício oferecido por algumas empresas que une o trabalho remoto às viagens de lazer.
Ele não tem regras e não está previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Cada empresa pode estabelecer o tempo de teletrabalho que achar melhor. No Brasil, esse período costuma ser de 30 a 90 dias.
A CI&T, empresa brasileira de tecnologia da informação e desenvolvimento de software, e o Google Brasil são algumas das organizações que já aderiram à tendência (veja o que dizem as organizações abaixo).
🕵️♀️ Mas, afinal, qual é a diferença do “workation” para o home office? O benefício permite que os profissionais exerçam as suas funções de qualquer lugar do mundo, em um determinado período de tempo e com a possibilidade de adaptar a jornada de trabalho ao fuso horário do país de destino.
Assim, é possível que o funcionário consiga fazer uma viagem na qual tenha momentos de lazer e também cumpra o expediente.
Em algumas empresas, assim como no caso da Giovana, é possível até emendar o tempo de “workation” com as férias ou feriados.
“É legal porque a gente cria uma rotina em outros país, mas sabe que é temporário. É o tipo de experiência que você só teria abandonando toda a sua vida no Brasil (…) E, ao mesmo tempo que tenho uma rotina, faço os passeios turísticos”, afirma Giovana, que é designer na CI&T.
Ficou curioso para saber mais sobre o “workation”? Abaixo, o g1explica o esquema a partir das seguintes perguntas:
A viagem é paga pela empresa?
Não. No “workation”, as empresas não têm a obrigatoriedade de pagar os custos das viagens, mas devem fornecer todos os equipamentos necessários para que os profissionais exerçam a suas funções.
Cuidados como a emissão de visto, hospedagem e compra de passagens são de responsabilidade dos trabalhadores.
Porém, cabe às organizações disponibilizar os documentos – que devem ser apresentados durante o embarque – para comprovar o domínio das ferramentas de trabalho, como computadores e celulares.
O salário é pago em R$?
Sim. Apesar de o trabalhador exercer a sua atividade em outro país, estado ou cidade, a remuneração deve ser paga em reais (R$), caso o contrato de trabalho tenha sido firmado no Brasil.
Vale ressaltar ainda que o salário do funcionário beneficiado com o “workation” não pode ser reduzido. Nesse caso, aplica-se o princípio da irredutibilidade salarial prevista na Constituição Federal.
Como funciona a relação do expediente com o fuso horário?
Por não ser um benefício com previsão legal, as empresas podem definir a jornada de trabalho mais adequada.
Desse modo, é possível estabelecer na política interna e no Termo Individual de Compromisso (um acordo feito entre empregador e empregado) que o tempo de expediente praticado durante o “workation” deve ser adaptado ou não ao fuso horário do país de destino.
Através das cláusulas, o empregado também pode se comprometer a atender os compromissos profissionais necessários no horário de Brasília, sem prejuízo ao período de descanso.
O que dizem as empresas?
No Google Brasil, a regras para o “workation” foram atualizadas durante a pandemia da Covid-19, em 2021. Antes, o benefício tinha duração de 14 dias. Hoje, é de até quatro semanas.
A “big tech” decidiu adotar a política para promover um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal dos colaboradores.
“Há momentos em que os “googlers” precisam estar em outras localidades, e nesses momentos eles podem usar a política (…) a repercussão foi muito positiva e bem recebida”, explica a líder de RH do Google Brasil, Carolina Priscilla.
Já na CI&T, o benefício foi implantado para tornar mais acessível a ida de funcionários ao exterior. Antes, somente profissionais em transferências para outras unidades tinham essa oportunidade.
A empresa, de origem brasileira, possui escritórios em outros oito países: EUA, Portugal, Canadá, Reino Unido, China, Japão, Austrália e Colômbia.
“Muitos pediam para trabalhar fora [do Brasil] para fazer um curso de idioma ou ver os parentes. Levou um tempo até conversar com as áreas e montar o programa, que foi lançado em 2022”, conta Cristiane Morais, gerente de RH na empresa de tecnologia.
Profissionais de todos os setores da CI&T podem usufruir do “workation”, que tem duração de até 90 dias. Esse período pode ser usado de forma fracionada e, inclusive, ser programado para mais de um país.
A empresa ainda permite a emenda do programa com as férias.
“A gente percebeu que os beneficiados vão em busca de praticar um idioma, ter a experiência de trabalhar em um país diferente e até de passar um tempo com parentes que moram fora. Também tem quem queira fazer aquela viagem dos sonhos, como Machu Picchu.”
Quais são as vantagens?
A união do trabalho remoto às viagens de lazer pode proporcionar a retenção de talentos dentro da empresa e atração de novos profissionais, afirma a especialista em carreiras e comunicação, Luana Lourenço.
“A gente fala muito sobre a importância da saúde mental e acredito que isso é um dos legados da pandemia. Flexibilizar o modelo de trabalho vai ao encontro desse mote (…) as novas gerações prezam por essa independência”.
A análise da especialista explica a sensação de Giovana Gabriel, que é designer da CI&T.
Ao ser beneficiada com o “worketion” e trabalhar por um mês em Barcelona, a jovem afirma que se sente mais empolgada para exercer a sua função na empresa.
“Hoje, eu tenho mais qualidade de vida e isso gera uma relação de troca, sabe? Eu me sinto mais motivada a entregar mais porque eu quero manter esse equilíbrio, cuidado, que eu recebo da empresa”, afirma Giovana.
Quais são os riscos?
O “workation” é mais um programa que acompanha a ascensão de modelos de trabalho flexíveis. Entre eles, a semana de quatro dias e a “short friday”, que reduz o horário de expediente às sextas.
Mas as empresas que desejam implantar o benefício precisam tomar alguns cuidados, principalmente em relação cultura e estrutura. Acontece que nem todas as organizações estão preparadas para lidar com o trabalho remoto.
Preparar a liderança, estabelecer regras para o programa e treinar os funcionários para atividades à distância são algumas das ações que devem ser tomadas antes de colocar o “workation” em ação, segundo Luana Lourenço.
“A liderança precisa abrir a mentalidade para entender que o resultado é mais importante que a presença física e quantidade de horas trabalhadas”.
Ainda de acordo com a especialista, ao implantar o “workation”, a empresa pode assumir o risco de lidar com deficiências na entrega de serviços.
Para que o trabalhador beneficiado continue sendo produtivo durante esse período, é necessário que ele tenha desenvolvido maturidade para fazer uma boa autogestão.
O que o empregador precisa saber antes de implementar?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não impõe regras para a implantação do “workation”, apesar de estabelecer condições para a prática do teletrabalho.
Como não há previsão legal, as empresas podem determinar as regras do benefício na política interna.
Informações sobre os setores elegíveis, o prazo de vigência e como funciona o esquema de entregas são algumas das informações que devem ser colocadas no documento.
“A política interna não exclui o cuidado de firmar um termo individual com o empregado que será beneficiado”, reforça a advogada especialista em direito trabalhista Juliana Roque.
Trabalho home office. Posso viajar sem avisar o meu chefe?
Depende. Assim como o “workation”, o sistema home office não tem previsão legal. Isso acontece porque a legislação utiliza o termo “teletrabalho” para se referir às profissões feitas à distância.
Nesse sentido, não há regras que obriguem o exercício da atividade em casa. Apesar disso, as empresas têm a liberdade para exigirem que os seus profissionais trabalhem exclusivamente em suas residências.
Essa determinação deve estar prevista no contrato de trabalho, o que dependerá da aceitação do empregado, já que o documento é resultado de um acordo bilateral. Ou seja, a sua efetivação deve ser aceita por ambas as partes, empregado e empregador.
*Portal G1, https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2024/06/28/workation-conheca-a-tendencia-que-une-viagem-de-lazer-ao-trabalho-adotada-por-algumas-empresas-no-brasil.ghtml, 28/06/2024