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Revista Isto é,
COMPORTAMENTO,
|  N° Edição:  2182 |  02.Set.11 – 21:00 |
 Atualizado em 05.Set.11 – 14:44

A fórmula dos vencedores


Como a ciência, a psicologia, o coaching e relatos de quem chegou lá explicam o
que faz uma pessoa subir ao topo

Débora Rubin

Aos 16
anos, ele já sabia o que queria fazer da vida. A decisão veio logo após vencer
411 oponentes de 72 países e ganhar a Olimpíada Internacional de Matemática,
competição mais importante da disciplina no mundo. Não fez faculdade, pois
concluiu o mestrado ao mesmo tempo em que terminou o ensino médio, numa das
instituições de pesquisa mais reverenciadas do País, o Instituto Nacional de
Matemática Pura e Aplicada (Impa), no Rio de Janeiro. Aos 18 anos, começou o
doutorado. Já publicou mais de 40 artigos em revistas internacionais, sendo que
vários deles nas três mais importantes publicações do mundo – “Annals of
Mathematics”, “Acta Mathematica” e “Inventiones Mathematicae”. Antes dos 30
anos, já era considerado um dos mais brilhantes matemáticos de sua geração.
Desde então, seu passe é disputado pelas melhores universidades do planeta.
Atualmente, aos 31 anos, é diretor de pesquisa do Centre National de la
Recherche Scientifique, o CNRS, na França, pesquisador do Impa e um dos
favoritos a conquistar a Medalha Fields, equivalente ao Nobel da matemática,
prêmio concedido de quatro em quatro anos para o principal nome do setor no
mundo.


Analisada sob os mais diversos ângulos, a trajetória do matemático carioca Artur
Ávila é a de um vencedor nato. Ele subiu vertiginosamente ao topo. E, mais
importante, manteve se lá. Transformou talento em sucesso, vontade em
planejamento, insegurança em determinação. Componentes da personalidade de
pessoas que, nas suas áreas de atuação, brilham mais do que as outras. Ao longo
desta reportagem, ISTOÉ irá contar a história de oito pessoas que, assim como
Ávila, são muito bem-sucedidas em suas áreas de atuação. Relatos inspiradores de
personagens à primeira vista bastante distintos, mas que têm muito em comum.
Psicólogos, neurocientistas e outros pesquisadores têm se debruçado nos últimos
tempos a estudar a personalidade de vitoriosos como esses brasileiros. Não param
de sair trabalhos acadêmicos sobre o tema, a fim de dissecar em que eles são
diferentes dos outros.


A primeira imagem que vem à cabeça quando pensamos em
vencedores, geralmente, está relacionada ao esporte. Nesse universo, não pairam
dúvidas sobre quem é o melhor. Ele está sempre em destaque, no mais alto do
pódio, com a medalha dourada exibida no peito. “Mas há mais jogadores com
talento para ser o melhor do mundo do que há vencedores”, diz o americano
Timothy Gallwey, 73 anos, pioneiro na técnica do coaching, consultor de empresas
como Apple e Coca-Cola e autor de vários best-sellers que relacionam o triunfo
no esporte ao mundo profissional. Segundo o conceito do coaching, criado nos
anos 70, todos podem ser bem-sucedidos se quiserem. “Somos nós quem criamos boa
parte dos nossos problemas”, lembra Gallwey (leia entrevista completa no site da
ISTOÉ). Para ele, a diferença entre os vencedores e os outros é que os primeiros
se atrapalham menos e deixam seus talentos fluirem com mais naturalidade. “Para
fazer isso, no entanto, eles precisam vencer a batalha contra o medo, a dúvida e
a insegurança, que não são guerras menores”, atesta o americano, que desenvolveu
sua prática a partir de uma experiência pessoal. Quando era professor, ele tirou
um ano sabático no qual se dedicou a ensinar tênis. Após um tempo como
instrutor, percebeu que estava ensinando do jeito errado. “Eu focava na técnica
e percebi que isso não dava resultado. Os grandes atletas não pensam que vão
acertar a bola, eles simplesmente acertam”, conta. A partir daí, o consultor
americano passou a dar diretrizes, não mais instruções, e os alunos começaram a
aprender. Mais do que isso, adaptou seu método, que ele chama de jogo interno –
em que o medo de perder, a dúvida, a falta de concentração e o estresse são os
maiores oponentes – para outras situações do cotidiano. “São princípios básicos
e adaptáveis.” Mas o grande segredo, segundo o próprio Gallwey, é prestar
atenção a si mesmo. “Meu método se baseia na ideia de que é a partir do aumento
da percepção que temos de nós mesmos que conseguimos melhorar.”

A
jogadora de futebol Marta venceu uma dúzia de batalhas antes de se tornar cinco
vezes a melhor do mundo. Venceu a pobreza extrema, o abandono do pai, a
distância dos grandes centros urbanos e o preconceito de ser uma mulher num
esporte masculino – inclusive entre a própria família. Se tivesse deixado se
convencer de que não tinha condição de ir atrás do grande sonho, talvez ainda
estivesse em Dois Riachos (AL), onde nasceu, trabalhando em alguma atividade que
lhe desse o sustento. “Sempre tive em mente que seria jogadora profissional, não
me via fazendo outra coisa”, diz. 

Diante
da improvável história de sucesso de Marta, que triunfou na aridez, fica a
pergunta: o que separa os vencedores dos perdedores? Os cientistas afirmam que
vencer é um conceito interdisciplinar, que envolve teorias sociológicas e
psicológicas, questões econômicas e químicas cerebrais. Os hormônios, por
exemplo, são um componente decisivo para a formação de um perfil bem-sucedido.
Uma das linhas de pesquisa do americano Pranjal Mehta, da Universidade de Oregon,
é desvendar a testosterona, também conhecido como hormônio da competição. Em um
estudo recente realizado na Universidade de Colúmbia, Mehta descobriu que quem
tem altos níveis desse hormônio briga melhor nas disputas individuais. Já as
pessoas com índices mais baixos tendem a vencer nas disputas em grupo. “Muito
provavelmente porque, em conjunto, é preciso ser cooperativo, coisa que quem tem
muito testosterona não é”, acredita o pesquisador. O cientista da Universidade
de Oregon também se debruçou sobre a questão da liderança, uma característica
presente no perfil de um vencedor. Após realizar testes com dezenas de alunos do
curso de administração, Mehta descobriu que não basta ter apenas altas doses de
testosterona para ser uma pessoa dominante. É preciso também que haja uma
combinação equilibrada com o cortisol, o hormônio do estresse. Quanto mais alta
a quantidade desse último, mais ele inibe os efeitos positivos do primeiro. “Os
alunos com muita testosterona e pouco cortisol eram os mais confiantes, calmos
e, ao mesmo tempo, dominantes.”

Se os
hormônios têm uma participação relevante nas vitórias particulares, seria
possível alterá-los na busca de melhores resultados? “Cerca de 50% da variação
hormonal pode ser explicada pelos genes, mas os outros 50% têm relação com
fatores externos”, explica o pesquisador americano. Por fatores externos,
entenda-se fazer atividades físicas ou dietas e até coisas um tanto insólitas,
como assistir a cenas de sexo. Os genes também têm seu papel nessa história. Num
outro estudo, conduzido pelo departamento de zoologia de Cambridge, os
cientistas constataram que a liderança tinha mais relação com o temperamento do
indivíduo do que com seus anos de estudo. Os líderes surgiam naturalmente
conforme as situações em que eles eram colocados nos testes se apresentavam. A
partir da pesquisa, os estudiosos definiram como seria um líder: audacioso,
questionador e extrovertido. Perfil de quem gosta de correr riscos, muito comum
entre empreendedores. É o caso do gaúcho Arri Coser, que tornou sua
churrascaria, a Fogo de Chão, um negócio internacional (leia abaixo) ao
emplacá-la no mercado americano. E de Clóvis Souza, que nos anos 2000, mesmo sem
entender nada de internet, criou um dos maiores negócios online do País.

Ter uma
motivação, externa ou interna, é outra característica em comum entre pessoas
vitoriosas. Um estudo conduzido por psicólogos da Universidade Washington de St.
Louis (EUA) mostra que, quando uma pessoa sabe que existe uma compensação, ela
fica muito mais concentrada. Durante testes feitos com jogadores que apostavam
dinheiro, toda vez que uma nota de um dólar era mostrada, o córtex pré-frontal
dorsolateral dos participantes – que coordena a interação entre o controle
cognitivo e as redes neurais ligadas à motivação – entrava em ação. Nesse
momento, a concentração era total. Mas a recompensa pode ser traduzida em
diversas formas – medalhas, contratos, metas superadas. Para André Akkari, o
maior jogador de pôquer do Brasil, ela veio em montantes de dinheiro que ele
nunca tinha sequer sonhado durante sua infância pobre. Akkari tinha 30 anos,
muitas dívidas e uma vida feita de negócios informais e malsucedidos quando
percebeu sua aptidão para o jogo. Hoje, é milionário e uma referência no
carteado. Para exercitar sua mente, ele participa de pelo menos 30 torneios por
dia ao mesmo tempo pela internet.

Para os
especialistas em coaching, Akkari é um ótimo exemplo de que as vitórias têm mais
a ver com o cérebro do que com acaso e habilidades físicas. “Vencer na vida é
pura estratégia mental”, afirma o presidente da Sociedade Brasileira de
Coaching, Villela da Matta. O que fez o jogador de pôquer programar sua mente
para o sucesso, sem nunca ter conhecido o coaching nem outra técnica similar?
Ele é, segundo os psicólogos, uma pessoa resiliente – alguém que consegue
atravessar as adversidades e construir um bem-estar em cima disso. Esse é um
perfil comum entre os vencedores. O vendedor de carros Michel Árabe, o maior do
Brasil, também redefiniu seu destino ao se ver desafiado pela necessidade.
Curiosamente, o vendedor Árabe, o jogador de pôquer Akkari, a jogadora Marta e o
empresário de internet Souza foram abandonados pelo pai ainda crianças. “Como
diria (Friedrich) Nietzsche, o que não mata fortalece”, lembra o psicólogo
clínico e neurocientista Julio Perez. O que afeta negativamente a vida da maior
parte das pessoas, tornou os quatro mais perseverantes em suas metas. “Superação
de adversidades se relaciona diretamente com fortalecimento de caráter e
desenvolvimento de virtudes como a coragem, a justiça e a paciência.”


Carregadas com tintas épicas ou não, a trajetória dos vencedores costuma
fascinar os reles mortais, que mantêm os olhos pregados aos seus movimentos.
Como se colocássemos nossa própria felicidade em jogo quando os vemos competir.
Os cientistas dizem que admiramos tanto as pessoas bem-sucedidas (e isso fica
muito claro no mundo esportivo) porque, em algum nível da estrutura cerebral,
nos colocamos no lugar deles. Em 4 de novembro de 2008, na noite da eleição
presidencial americana, os neurocientistas das universidades de Duke e Michigan
ficaram colados a um grupo de eleitores. Eles coletaram amostras de hormônio no
momento do fechamento das urnas e quando Barack Obama foi declarado vencedor. E
concluíram que os níveis de testosterona, o hormônio da competição, que
normalmente caem durante a noite, mantiveram-se altos entre os eleitores de
Obama. Já entre os que votaram em John McCain, houve uma queda. Os pesquisadores
aplicaram os mesmos testes em homens que assistiram a partidas de futebol e
basquete e o resultado foi o mesmo – altos níveis de testosterona entre os
torcedores dos times vencedores. Está comprovado, então, que nos projetamos nas
pessoas vitoriosas. Resta aprender com elas a conhecermos nossos potenciais, não
duvidar de nós mesmos, e seguir adiante.

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