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Folha de São Paulo, The New York Times, segunda-feira, 27 de
agosto de 2012

Robôs versus humanos

Novas tecnologias reacendem o debate

Por JOHN MARKOFF, DRACHTEN, Holanda

Na fábrica da Philips na costa chinesa, centenas
de operários usam as mãos e ferramentas especializadas para montar barbeadores
elétricos. Esse é o modo antigo de trabalhar.

Numa fábrica da mesma empresa em Drachten, na
Holanda, 128 braços robóticos realizam o mesmo trabalho com flexibilidade digna
de iogues. Câmeras de vídeo os guiam para realizar façanhas que superam a
capacidade do humano mais hábil que exista.

Trabalhando sem parar, um braço robótico forma
três dobras perfeitas em dois fios conectores e os insere em furos tão pequenos
que são quase invisíveis. Os braços trabalham tão rapidamente que precisam ficar
fechados em gaiolas de vidro para que as pessoas que os supervisionam não se
machuquem. E eles fazem tudo isso sem uma pausa para tomar um café, trabalhando
três turnos por dia, 365 dias por ano.

A fábrica holandesa tem ao todo algumas dezenas
de operários humanos por turno -mais ou menos um décimo do número visto na
fábrica chinesa, na cidade de Zhuhai.

Isto é o futuro. Uma nova onda de robôs, muito
mais destros que os robôs já empregados comumente hoje por montadoras de
automóveis e outros setores manufatureiros pesados, estão substituindo
trabalhadores humanos em todo o mundo, tanto na manufatura quanto na
distribuição.

Fábricas como esta, na Holanda, formam um
contraponto marcante com as fábricas usadas pela Apple e por outras empresas
gigantes de eletrônicos para o consumidor, que empregam centenas de milhares de
operários pouco qualificados em busca de baixo custo.

"Com estas máquinas, podemos produzir qualquer
eletrônico de consumo do mundo", disse Binne Visser, gerente da linha de
montagem da Philips em Drachten.

Muitos executivos industriais e especialistas em
tecnologia dizem que a abordagem usada pela Philips está superando a da Apple.

Ao mesmo tempo em que a Foxconn, que produz o
iPhone da Apple, continua a construir novas fábricas e contratar milhares de
operários adicionais para fabricar smartphones, ela planeja instalar mais de 1
milhão de robôs dentro de alguns anos, para complementar sua força de trabalho
na China.

Tecnologias renovam aposta na robótica

Por JOHN MARKOFF

A Foxconn não informou quantos operários serão
dispensados. Mas seu presidente, Terry Gou, endossa o uso crescente de robôs. De
acordo com a agência oficial de notícias, Xinhua, em janeiro Gou declarou,
falando de seus mais de 1 milhão de empregados: "Como os seres humanos também
são animais, gerir 1 milhão de animais me dá dor de cabeça".

Os custos decrescentes e a sofisticação crescente dos
robôs reativaram uma discussão em torno da velocidade em que empregos serão
perdidos. Neste ano os economistas Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee, do
Instituto de Tecnologia do Massachusetts, apresentaram argumentos em favor de
uma transformação rápida. "A usurpação das habilidades humanas pelos robôs nesse
ritmo e escala é recente e possui implicações econômicas profundas", escreveram
eles em seu livro "Race Against the Machine" ("Corrida Contra a Máquina").

Para eles, a chegada da automação de baixo custo
anuncia transformações da mesma escala da revolução na tecnologia agrícola
ocorrida no século passado, quando o emprego na agricultura nos EUA caiu de 40%
da força de trabalho para 2%.

Mas Bran Ferren, veterano especialista em robótica e
designer de produtos industriais na Applied Minds, de Glendale, Califórnia,
argumenta que ainda há obstáculos grandes "Inicialmente, eu tinha a ingenuidade
de pensar em robôs universais que fossem capazes de fazer tudo", contou. "Mas é
preciso ter pessoas por perto, de qualquer maneira. E as pessoas são boas em
entender como mexer com aquele radiador ou acoplar aquela mangueira. Coisas como
essas ainda são difíceis para robôs."

Mais além dos desafios técnicos, há a resistência de
operários sindicalizados e comunidades preocupadas com a perda de empregos.
Embora o aumento dos custos da mão de obra e dos transportes na Ásia e o medo do
roubo de propriedade intelectual estejam trazendo alguns trabalhos de volta para
o Ocidente, a ascensão dos robôs pode significar que serão gerados menos
empregos.

Na fábrica de painéis solares Flextronic, em Milpitas,
ao sul de San Francisco, uma faixa proclama "Trazendo Empregos e Manufatura de
Volta à Califórnia!". Dentro da fábrica, contudo, vêem-se robôs por toda parte e
poucos trabalhadores humanos. Todo o levantamento de cargas pesadas e quase todo
o trabalho de precisão é feito por robôs. Os trabalhadores humanos cortam
material em excesso, passam fios por furos e aparafusam alguns prendedores.

Esse tipo de avanço no setor manufatureiro também
está provocando transformações em outros setores que empregam milhões de
trabalhadores. Um desses setores é o da distribuição, em que robôs que se
movimentam na velocidade dos corredores mais velozes do mundo são capazes de
armazenar, pegar e embalar mercadorias para transporte, com muito mais
eficiência que os humanos.

Os avanços rápidos nas tecnologias de visão e tato
estão colocando uma grande gama de tarefas manuais ao alcance das habilidades
dos robôs. Por exemplo, os jatos comerciais da Boeing agora são rebitados
automaticamente por máquinas gigantes que se movimentam com rapidez e precisão
sobre a superfície dos aviões.

Na Earthbound Farms, na Califórnia, quatro braços
robóticos recém-instalados, com copos de sucção customizados, empacotam
embalagens de alface orgânica em caixas para transporte. Cada robô faz o
trabalho de até cinco trabalhadores humanos.

Corrida de robôs

Numa feira comercial de automação em Chicago, no ano
passado, Ron Potter, diretor de tecnologia de robótica na consultoria Factory
Automation Systems, de Atlanta, ofereceu um exemplo de um sistema manufatureiro
robótico que custou inicialmente US$ 250 mil e tomou o lugar de dois operadores
de máquinas, cada um dos quais ganhava US$ 50 mil por ano. Ao longo dos 15 anos
de vida do sistema, as máquinas possibilitaram economia de US$ 3,5 milhões em
mão de obra e produtividade.

O governo e executivos industriais nos EUA argumentam
que, mesmo que as fábricas sejam automatizadas, ainda são uma fonte importante
de empregos. Se os EUA não competir pela manufatura avançada em setores como o
da eletrônica para consumidores, poderá perder também nas áreas de engenharia e
design. Além disso, embora sejam perdidos mais empregos de colarinho azul, a
manufatura mais eficiente vai gerar empregos qualificados no design, na operação
e na manutenção das linhas de montagem.

E os fabricantes de robôs dizem que seu próprio setor
gera empregos. Um relatório encomendado no ano passado pela Federação
Internacional de Robótica constatou que os produtores de robótica em todo o
mundo já empregavam 150 mil pessoas em todo o mundo.

Mas o domínio americano e europeu na próxima geração
da indústria é incerto. "O que eu vejo é que os chineses também vão usar robôs",
disse Frans van Houten, presidente da Philips. "A janela de oportunidade para
trazer a manufatura de volta para nós é antes de isso acontecer."

Linha de montagem veloz

Na Tesla Motors, em Fremont, na Califórnia, até oito
robôs fazem um balé em torno de cada veículo quando ele para por apenas cinco
minutos em cada estação ao longo da linha de produção. Os braços robóticos
parecem humanos quando se estendem e trocam de "mão" para realizar uma tarefa
diferente. Muitos robôs em fábricas de automóveis realizam apenas uma função,
mas os robôs da Tesla dão conta de até quatro: soldar, rebitar, colar e instalar
um componente. O objetivo é que até 83 sedãs de luxo elétricos Tesla S sejam
produzidos por dia na fábrica. Quando a empresa começar a produzir um utilitário
esportivo, no próximo ano, os robôs serão reprogramados e o veículo novo será
produzido na mesma linha de montagem.

A fábrica da Tesla é pequena, mas representa uma
aposta nos robôs flexíveis, algo que pode ser um modelo para o setor.

Recentemente, a Hyundai e a Beijing Motors abriram
uma fábrica nos arredores de Pequim que poderá produzir 1 milhão de veículos por
ano, usando mais robôs e menos pessoas que as fábricas grandes de seus
concorrentes, e com a mesma flexibilidade que a da Tesla, disse Paul Chau,
investidor americano da WI Harper.

Novo papel dos humanos

Nos dez anos passados desde que começou a trabalhar
num depósito em Tolleson, Arizona, Josh Graves já viu como os sistemas de
automação podem facilitar o trabalho, mas também criar estresse e inseguranças
novos. O depósito no qual ele trabalha distribui produtos alimentícios a granel
para a rede de supermercados Kroger.

Graves, 29, começou a trabalhar no depósito assim que
terminou o ensino médio. O emprego exigia o levantar caixas pesadas, e ele
trabalhava muitas horas por dia.

Hoje, Graves dirige uma máquina pequena semelhante a
uma empilhadeira. Ele usa fones de ouvido; uma voz computadorizada lhe diz onde
no depósito deve ir para buscar ou armazenar produtos. Um computador
centralizado, apelidado pelos operários de Cérebro, dita a velocidade das
empilhadeiras. Os gerentes sabem exatamente o que os operários estão fazendo em
cada minuto.

Segundo Rome Aloise, vice-presidente para a
Califórnia do sindicato de trabalhadores do setor, como os operários fazem menos
trabalho físico, ocorrem menos lesões. Pelo fato de o ritmo de trabalho ser
ditado por um computador, o estresse hoje é mais psicológico.

Vários anos atrás, o depósito de Graves instalou um
sistema alemão que automaticamente armazena caixas de alimentos e os tira de
prateleiras. O sistema levou à eliminação de 106 empregos, ou 20% da força de
trabalho.

Agora, a Kroger pretende construir um depósito
altamente automatizado em Tolleson.

"Não temos um problema com a chegada das máquinas",
Graves disse a funcionários da prefeitura. "Mas diga à Kroger que não queremos
perder esses empregos em nossa cidade."

Certos tipos de trabalho ainda estão fora do alcance
da automação: empregos na construção, que requerem que trabalhadores se
movimentem em locais imprevisíveis e realizem tarefas não repetitivas; montagens
que exigem feedback tátil, como a colocação de painéis de fibra de vidro no
interior de aeronaves, barcos ou carros e tarefas de montagem em que é feita uma
quantidade limitada de produtos, o que exigiria a reprogramação dos robôs, algo
que custa caro. Mas essa lista de trabalhos está encolhendo.





ON-LINE: FÁBRICA DO FUTURO

Um vídeo sobre as novidades na
robótica: 
nytimes.com.

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