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O Estado de São Paulo, Domingo, 2 novembro de 2008


FEMININO



Saídos do forno



Conheça promessas do design de moda, jóias e sapatos: garotas que têm tudo para
trilhar vida longa no mercado

Mariana Abreu Sodré

Achar novos estilistas,
designers de jóias e de sapatos é tarefa fácil. O difícil é encontrar nomes bons
e consistentes. E fazer apostas, todos sabem, é sempre arriscado. O Feminino
considerou como critérios básicos para a escolha dos profissionais aqui
entrevistados: criatividade, novidade, qualidade e identidade. Características
que deveriam ser inerentes a qualquer marca, mas que infelizmente nem sempre
são. Basta uma voltinha por aí para constatar.

 

No meio do caminho, entre uma
entrevista e outra, foi revelado outro ponto em comum entre as garotas
escolhidas: a despretensão. Explica-se: ao mesmo tempo em que todas, obviamente,
querem dar certo e já colhem bons frutos, nenhuma pretende ser o grande
acontecimento do mundo fashion, tampouco se iludem com o tal glamour do métier.
Não usam gírias fashionistas e têm os pés no chão. Só querem fazer o que gostam,
sabem e fazem bem. Trata-se de uma nova turma, e das boas!

 


ROUPAS

 

Você não encontrará o último
grito da moda nas araras da marca Erre, inaugurada em março. As sócias e irmãs
Renata e Claudia de Goeye não são do tipo “vítimas da moda”. “Pelo contrário,
nós fugimos das tendências”, diz Renata, que segue a contramão da moda com
maestria, aos 28 anos. Formada em jornalismo, ela foi colaborar com a equipe de
criação da Raia de Goeye, grife da irmã mais velha. Durante seis anos,
desenvolveu o expertise que agora apresenta de forma mais autoral em sua nova
marca.

 

Claudia, 25 anos, é
publicitária, e também o braço administrativo da etiqueta que é aparentemente do
contra, a começar pelo próprio nome: erre. “Antes de abrirmos a loja, as pessoas
ligavam o Erre, que vem da letra erre, ao verbo errar. Deixamos por isso mesmo.
Qual o problema de errar?”, fala Claudia, com a segurança de quem sabe ter
acertado. E em cheio.

 

Para se ter uma idéia, a
primeira coleção da marca vendeu como água, a ponto de o estoque ter sido quase
esgotado. “Isso é bom e ruim ao mesmo tempo”, frisa a dupla, agora com o segundo
terço da primavera verão à venda. As clientes/fãs da Erre, dizem elas, são
mulheres entre 20 e 50 anos. “Ficamos surpresas. Esperávamos atingir um público
de até 40 anos”, comenta Claudia. É complicado apontar “o” segredo da Erre. Mas
vale saber que as peças da grife são feitas em tecidos de alta qualidade (sedas,
linhos, algodões), traduzidos por Renata como “aqueles que dão vontade de
abraçar, de toque macio”. Acabamento e corte são impecáveis. A maioria das
criações dispensa estampas, decotes profundos e abusa da amplitude. Há poucas
repetições de cada modelo. E na Erre não tem espaço para os justos, os colados
ao corpo. A grife atinge o equilíbrio entre o sofisticado e o despojado. Tem o
que chamam de bossa, brinca com a silhueta feminina, prioriza o conforto e,
assim, acaba sendo sensual sem a intenção de ser. Um feito alcançado por poucos,
pouquíssimos estilistas, incluindo os mais experientes.

 

“Para criar, nos baseamos em
uma mulher que se gosta muito, que se cuida e tem personalidade, não importa
qual”, explica Renata, referindo-se àquelas seguras e felizes, a exemplo dela
própria e da irmã Claudia. “Muito deste conceito (da marca) vem do estilo da
minha mãe, Yvone, que morou em diferentes lugares do mundo e sempre se vestiu de
forma chique e confortável, usou e usa muita calça de gancho baixo, por
exemplo”, explica a estilista, que aposta nos modelos, que, sim, estão na moda,
mas antes disso, no DNA criativo da Erre. “Hoje qualquer garota quer ter uma
marca, ser estilista. Nós nos preocupamos muito em ter uma identidade forte. Não
queríamos ser apenas mais uma”, diz Claudia. As peças variam de R$ 200,00 a R$
700,00, com raras exceções. “Queremos ser acessíveis”, pontua Renata, para
finalizar.

 


JÓIAS

 

Juliana Accioly, 27 anos,
sempre usou muitos brincos, colares, anéis, braceletes e pulseiras. Movida por
esse fascínio, dez anos atrás, desenvolveu sua primeira peça: um brinco de
madrepérola em formato de borboleta, que só encontrava em seu pensamento. Mas
seu “lado designer” logo foi desenvolvido pela faculdade de marketing de moda;
depois pelo estágio na Vogue e pela colaboração para outras mídias. Até
desenvolver sua segunda criação, Juliana passou ainda pela New York University (NYU)
e pelo Fashion Institute of Teconology (FIT), ambos em Nova York. Somente em
2006, finalmente, deu forma a outro desejo: um bracelete que traz o símbolo do
infinito – o numeral 8, digamos, deitado.

 

A peça foi desenhada e
executada com o auxílio de um ourives na Grécia, onde Juliana passava férias ao
lado do noivo. O bracelete (lindo, por sinal) virou o símbolo do casal, e marcou
a decisão de Juliana de seguir a carreira de designer. Ao desembarcar no Brasil,
matriculou-se em um curso de especialização na Fundação Armando Álvares Penteado
(FAAP). E, em pouco tempo, estava vendendo suas jóias e semi-jóias para as
amigas. No ano passado, começou a comercializar as criações – com prata, ouro
branco e pedras semipreciosas (ou preciosas, sob encomenda) – em lojas como
Marcella Sant’anna, Triya e Cecília Echenique. O passo seguinte foi levar as
peças para a joalheria MonteCristo, e o mais recente, a coleção que desenvolve,
mas não assina, para a NK Store, cheia de toques étnicos.

 

“Como consumidora, não gosto de
encontrar o mesmo produto toda vez que vou a uma loja. Por isso, mesmo quando
troco a coleção, não fico mais de três meses no mesmo ponto de venda”, comenta
ela, pronta para lançar sua quinta coleção, que trará conchas no lugar de
pedras. “São conchas de meu acervo pessoal para não degradar o meio ambiente. A
idéia é mostrar como são valiosas e propor o uso delas como amuletos”, explica
Juliana – sim, muito supersticiosa, cheia de consciência ambiental e
freqüentadora assídua de Ilhabela.

 

Mas enganam-se os que pensam
que a inspiração da moça vem do litoral paulista ou da natureza. Ligadíssima em
arte, Juliana tira referências para suas peças de exposições e visitas a museus
ao redor do mundo. Filmes e palestras, como as do portal WGSN, também rendem
boas idéias, diz ela, fã de jóias estilo art noveau e do trabalho dos joalheiros
Jack Vartanian e Vera Serena. “Eu os admiro muito. Mas não uso as criações
deles, que são lindas, como referência. Nossos estilos são bem diferentes”,
deixa claro a designer, que também não bebe em fontes estrangeiras. “No Brasil
temos muitas pedras e uma identidade tão forte que não é preciso olhar para
fora”, afirma Juliana, antes de definir suas criações. “São sensuais e não
sexies, o que é completamente diferente. Além de despretensiosas, são
exclusivas, contam com poucas réplicas e têm preços acessíveis. Custam, em
média, R$ 400,00”, completa a designer.

 


SAPATOS E ACESSÓRIOS

 

Quando estava no último ano do
curso de moda na Faculdade Santa Marcelina, Luiza Perea foi selecionada para
desfilar sua coleção de acessórios no Projeto Fábrica do Shopping Morumbi (um
evento que promovia novos talentos da moda). Teve que desenhar alguns sapatos
para compor os looks da apresentação. Era a primeira vez que se aventurava na
criação de sapatos, uma paixão pessoal. E, logo nesta experiência inaugural,
teve sucesso absoluto: vendeu todos os pares no backstage do desfile. Contudo,
Luiza não desenvolveu nenhuma outra coleção de calçados nos dois anos seguintes,
e focou nos acessórios. Criava sapatos somente para uso próprio.

 

Eis que no final de 2007,
decidiu espontaneamente lançar uma coleção de sapatos. Nascida em Barra Bonita,
passou a vendê-los em Ribeirão Preto, para depois comercializá-los também em seu
ateliê no bairro do Sumaré, em São Paulo. As peças são todas artesanais,
inclusive o processo de pintura de couro. E Luiza trabalha com profissionais
terceirizados, criando exatamente aquilo que gosta de calçar. Assim, não há
botas entre suas criações. Os scarpins também não aparecem em volume. Enquanto
sapatos rasteiros, cheios de detalhes, com fusão de matérias-primas e muito
conforto se multiplicam.

 

“Eu mesma faço o teste dos
pares. Os protótipos são todos no meu número, para garantir conforto total às
clientes. Não me importo em ter que refazer a peça para chegar à qualidade
máxima”, conta. “Prezo os modelos que podem ser usados durante o dia, para o
trabalho, ou à noite. Não sigo as tendências da moda. Vez ou outra, uso alguns
elementos que estejam em alta, mas procuro realizar aquilo que não pode ser
encontrado em cada esquina”, completa a designer super versátil.

 

O preço médio de uma criação da
marca Luiza Perea é de R$ 450,00. “Um valor honesto pela qualidade artesanal e
de matéria-prima, e pelo design do produto. As minhas clientes valorizam muito
esses aspectos, e eu trabalho com uma margem de lucro muito baixa. Afinal, estou
começando e faço peças para serem vendidas”, explica Luiza, que não conta com
sobras de estoque das últimas duas coleções.

 


Atualmente, a designer prepara a terceira edição de pares da marca, a de alto
verão. “Quero manter esse formato pequeno por mais um tempo. É claro que desejo
que a minha marca cresça, mas não muito. Prefiro manter a pessoalidade do meu
trabalho”, afirma. As sobras de couro dos sapatos vão para a confecção dos
(lindos) acessórios que Luiza continua criando, mas, agora, em menor escala.


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