VEJA, Edição
2065, 18 de junho de 2008
Sexo e o
guarda-roupa
Gênero faz a diferença nas produções
em que o figurino é a atração principal
Bel Moherdaui
Ir ao cinema para ver o último
lançamento de Spielberg (ou de Woody Allen, como insistem alguns) ou aquele
filme com a Angelina Jolie que não dá nem para lembrar o nome, bastando o de sua
deslumbrante protagonista, é a motivação habitual. Incomum é a tendência, ainda
no nascedouro mas já profusamente badalada, de ver um filme por causa,
sobretudo, do figurinista. Ou melhor, da figurinista: Patricia Field. Famosa
tanto pela cabeleira vermelha quanto pelos arroubos criativos que deram graça a
Carrie Bradshaw e companhia no seriado Sex and the City, essa
nova-iorquina descendente de armênios e gregos tem levado multidões de mulheres
para ver a versão cinematográfica. Feito em pedaços, merecidamente, pelos
especialistas, o filme arrecadou em duas semanas 200 milhões de dólares. O
público feminino não liga para os comentários da crítica (nem dos homens que se
recusam com teimosia a chegar perto dele), interessado primordialmente em duas
coisas. Primeiro, saber se a personagem principal, interpretada por Sarah
Jessica Parker, vai por fim se casar com Mr. Big, o namorado vai-e-volta.
Segundo, e talvez principalmente, ver o que as atrizes estão usando. Expectativa
amplamente atendida pelas 300 trocas de roupa das amigas Carrie, Samantha,
Charlotte e Miranda durante os 148 minutos do filme. Na telona, o guarda-roupa,
assim como o sexo, se mostra bem menos casual do que na televisão. Mesmo assim,
a atração para as loucas por moda está consolidada de maneira tão veemente que,
tal como acontece com os grandes diretores de cinema, Patricia está fazendo
escola: seu estilo já é replicado, de maneira mais jovem e leve, em Gossip
Girl, um seriado em que as roupas também estão no centro das atenções.
Antes de se tornar figurinista, ela
era uma stylist, o nome que se dá ao profissional que monta – e afina – a
imagem completa apresentada num desfile ou numa foto de moda (roupa, acessórios,
maquiagem e clima). Conhecedora de todos os truques do ramo, transpôs para
Sex and the City o moderno jeito de compor um figurino chamado de high
and low – a mistura de altas grifes com peças baratas de lojas populares.
Por causa, justamente, do sucesso da série e do interesse das marcas de
luxo em aparecer no filme, especialistas em moda acham que ela ressaltou demais
o high e se esqueceu do low. "Patricia Field subiu um pouco o tom
do figurino no filme, até como uma tentativa de caracterizar melhor cada uma das
personagens", analisa Juliana Maia, responsável pelo departamento de figurinos
da MTV. Como a mágica do cinema é fazer o espectador acreditar, durante duas
horas, que os arqueólogos usam jaqueta de couro, chapéu e chicote, o público do
filme acha perfeitamente aceitável que Carrie exiba, e nomeie, os sete
espetaculares vestidos de noiva que arrancam suspiros da platéia: Vera Wang,
Carolina Herrera, Christian Lacroix, Lanvin, Dior, Oscar de la Renta e o
definitivo, Vivienne Westwood.
Entre o seriado e a versão para o
cinema, Patricia Field deixou a sua exuberante marca em O Diabo Veste Prada,
outro filme mais famoso pelo guarda-roupa do que pelo roteiro ou pela densidade
dramática. Não se espere também nada de tematicamente intenso do seriado
Gossip Girl, que tem sua primeira temporada reprisada agora na televisão
paga e estréia prevista (como A Garota do Blog), no SBT, para o segundo
semestre. Em compensação, as roupinhas das duas protagonistas, alunas de um
colégio de elite de Manhattan, são uma delícia. A afinidade com Sex and the
City, mostrada nas fotos desta reportagem, não surgiu do acaso: o
figurinista Eric Daman trabalhou com Patricia Field e tem qualidades similares –
olho para detectar tendências, mão para misturá-las. Gravatinhas, meias
cinco-oitavos (dois dedinhos acima do joelho), estampas florais pixelizadas e
bolsas gigantescas (e vermelhas) são alguns dos elementos em comum entre as
quarentonas de Sex and the City e as adolescentes de
Gossip Girl.
As personagens Blair Waldorf (Leigh-ton
Meester) e Serena van der Woodsen (Blake Lively) já têm um lugar no mapa da moda
de tamanho suficiente para ser chamadas pelo nome. "Tanto a Serena quanto a
Carrie misturam o moderno com o folk, o que é genial. A Carrie misturava
camiseta hippie com sapato Manolo (Blahnik, evidentemente), e a Serena
também tem essa liberdade, por exemplo, de misturar um vestido amarelo mais
simples com uma estola de pele", compara a estilista Thais Losso, que acompanha
os dois fenômenos com igual atenção. Está certo que é ficção, mas as quarentonas
de Sex não parecem juvenis demais, enquanto as garotas de Girl
exibem excesso de sofisticação? "Tenho 30 anos e me sinto como se tivesse 20",
responde a estilista Letícia Toniazzo, que confessa levar os dois hits no
celular. "Minhas amigas de 35 anos se vestem como garotas, de tênis, jeans e
camiseta. Ao mesmo tempo, as adolescentes não querem se vestir como meninas de
15 anos, mas como mulheres de 25. Assim, não tem como os figurinos ficarem muito
diferentes." E não tem como o guarda-roupa não ser a atração principal,
sobretudo num filme em que a noiva troca a aliança de brilhantes por "um closet
realmente grande".
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