Folha de São Paulo, Mercado, SÁBADO, 8 DE MARÇO DE 2014



ENTREVISTA – LUIZ BARSI FILHO

Qualquer brasileiro poderia se tornar o “rei da Bolsa”

Com mais de R$ 1 bi em ações, advogado fez
fortuna com dividendos, lucro das empresas distribuído aos acionistas

ANDERSON FIGODE SÃO PAULO

Jeans, camisa e óculos pendurado no pescoço.
Quem passa por Luiz Barsi Filho pelas ruas do centro da cidade de São Paulo não
imagina que o advogado e economista de 74 anos é um dos maiores investidores da
Bolsa brasileira.

Com mais de R$ 1 bilhão aplicado em ações locais
e listado em 120º lugar no ranking de bilionários da revista “Forbes” em 2013,
Barsi é uma lenda do mercado disfarçada na imagem de um senhor de cabelos
brancos que se camufla diariamente entre os usuários da linha azul do metrô
paulista, que usa para ir à corretora em que opera.

A sua estratégia de sucesso, diz, é usar a Bolsa
para construir uma carteira previdenciária com papéis de empresas com bom
histórico de pagamento de proventos –fatia do lucro distribuída aos acionistas.

“Assim, quanto mais a Bolsa cai, mais eu ganho”,
afirma. Isso porque aproveita o valor mais baixo dos papéis para comprar mais e,
consequentemente, aumentar a remuneração em proventos.

Barsi critica o incentivo do governo à caderneta
de poupança, diz que os brasileiros são acomodados à renda fixa e que conseguiu
algo que qualquer pessoa alcançaria.

Folha – O senhor vem de uma família simples
de imigrantes espanhóis. Como se tornou o “rei da Bolsa”?

Luiz Barsi Filho –
Fiz algo que qualquer brasileiro pode fazer. Basta ter disciplina e paciência.
Há 47 anos, comecei a adquirir ações com o objetivo de ter uma carteira
previdenciária lastreada em dividendos e juros sobre o capital próprio [fatias
do lucro das empresas distribuídas aos acionistas].

A primeira ação que comprei na vida chamava-se
Cia. Antarctica Paulista, hoje incorporada à Ambev [setor de bebidas]. Quando
resolvi estruturar a carteira de previdência, comprei a Cesp.

Agora, tenho 15 papéis, sendo 12 de maior
concentração, como Banco do Brasil, Klabin [papel e celulose] e Ultrapar
[diversos setores, como distribuição de combustíveis e químico].

Qual o segredo para escolher as melhores
companhias?

Comprar papéis de empresas com bom histórico de
gestão e resultados reduz drasticamente o risco. É diferente do que aconteceu
com as ações do Eike Batista, que vendeu projetos, fantasias.

O pessoal comprou o quê? Uma imagem. Se você só
comprar boas ações e as mantiver, não terá dor de cabeça. Não dá para ser
especulador.

O senhor possui 15 empresas no atual
portfólio. Não são muitas para quem tem mais de R$ 1 bilhão na Bolsa. Acha
importante diversificar?

Uma carteira de previdência na Bolsa não se
inicia pegando todo o recurso e distribuindo entre várias empresas. Há um elenco
de companhias que pagam ótimos dividendos. Tem de comprar no momento certo.

E qual é o momento certo para comprar outras
ações?

A diversificação é uma consequência, não
necessidade. Se você comprar Eletrobras agora, por exemplo, ela vai deixar de
ser um “dividendo inteligente” quando pagar o dividendo, porque o próximo
pagamento será só depois de um ano. Então, esse será o ponto certo para
diversificar, procurando um novo “dividendo inteligente”.

O senhor se considera parceiro das empresas
em que investe. Qual a vantagem em ser parceiro e não o dono de um negócio?

É que ganho sem administrar a empresa. Mas
participo. O brasileiro não costuma olhar com esses olhos. Nos EUA, há
assembleias de empresas de capital aberto com até 40 mil participantes.

São parceiros que querem estar por dentro,
ajudando as companhias a crescer. Lá, isso é bem comum porque eles não têm
caderneta de poupança, ou seja, precisam procurar outras formas de ganhar em
suas aplicações.

Esse tipo de parceria resiste a momentos de
baixa da Bolsa?

Sim, ela se fortalece nas crises. Quando você
estabelece um programa de longo prazo, sua torcida é diferente da de quem compra
para especular.

No segundo caso, a torcida é para a Bolsa subir.
No primeiro –o meu–, a torcida é para a Bolsa cair, para comprar mais. Aí, não
se ganha em razão do valor aplicado, mas sim da quantidade.

Se a empresa paga dividendo de R$ 0,10 por papel
e você tem 100 ações, o ganho será de R$ 10. E, se tem 1 milhão de ações,
lucrará R$ 100 mil.

Mas, quando a Bolsa cai, as empresas também
pagam menos dividendos, não é?

Mesmo que as empresas tendam a diminuir o
percentual pago em dividendos, você ainda tem a expectativa de receber algo. Não
há perda.

O setor elétrico sempre foi visto como bom
pagador de dividendos. Essa remuneração aos acionistas caiu após a revisão
tarifária. O que o senhor acha disso?

O setor elétrico ainda paga bons dividendos. A
Eletropaulo anunciou há pouco o pagamento de dividendo de R$ 0,40 por ação. Essa
empresa chegou a pagar R$ 7 de dividendo por ação. Mas isso foi quando o papel
custava R$ 40. Hoje, custa R$ 8.

Proporcionalmente, é a mesma coisa. Agora, você
pode comprar mais papéis dela. Eu, antes, não tinha Eletropaulo, porque a ação
era muito cara. Hoje, tenho.

Se eu pudesse, daria um beijo na boca da
presidente Dilma Rousseff. Com essa revisão tarifária, que forçou as companhias
elétricas a reduzir o valor cobrado pela energia, ela derrubou todos os preços
[das ações dessas companhias]. Ela criou uma crise no setor e libertou os meus
recursos para investir nesses papéis.

Nenhum país vive sem energia. Dilma já está
sentindo os efeitos da burrada. Agora, o governo tem de botar a mão no bolso
para ajudar as empresas a prosseguir.

Os especialistas colocam a Bolsa como uma
aplicação de alto risco. O senhor concorda?

[Fernando] Collor, em seu primeiro dia de
governo, ditou uma lei que acabava com o cruzado novo e instituía o cruzeiro.
Todos os que tinham aplicações em renda fixa foram encurralados. A partir
daquele dia, se você tinha dinheiro no banco, não podia tirar em cruzado novo,
porque a moeda era cruzeiro.

Tudo o que era considerado garantido não teve
garantia. Por outro lado, aquilo que é considerado de alto risco ficou ileso.
Ninguém mexeu com as ações.

Um dia antes da edição do Plano Collor, você
vendia ações e recebia em cruzado novo. No dia seguinte, vendia os papéis e
recebia em cruzeiro. Não houve nenhum confisco ou bloqueio. Ninguém nunca vai
botar a mão nas suas ações.

O senhor fez fortuna na Bolsa, mas a
aplicação “queridinha” dos brasileiros é a poupança. Qual sua visão sobre isso?

O brasileiro não norteia suas aplicações para
que seja um ganhador. Lamentavelmente, foi induzido a praticar “agiotagem”.
Empresta para tudo: para o banco, para o governo. Em geral, não há interesse em
procurar outros tipos de aplicação.

O que o senhor acha do principal índice da
Bolsa brasileira, o Ibovespa?

É apenas um indicador de comportamento e mal
constituído, que colocou em sua composição as ações do Eike Batista a R$ 16/R$
17 e elas acabaram caindo para centavos. Esses projetos do Eike são de difícil
recuperação ao longo dos anos.

Eu não compro o índice. Compro bons negócios, já
consolidados e com boa expectativa de dividendos.

O senhor não investe em Petrobras. Por quê?

A Petrobras deveria ter 60 mil funcionários, mas
tem 250 mil. Então, tenho ações do grupo dono da Ipiranga, que deveria funcionar
com 30 mil pessoas e tem 15 mil. É outra filosofia. Dá lucro e paga dividendos.



RAIO-X – LUIZ BARSI FILHO

Idade:

74 anos


Formação:

graduado
em direito pela Faculdade de Direito de Varginha e em economia pela FEA
(Faculdade de Economia, Finanças e Administração) da USP (Universidade de São
Paulo)


Ocupação:


Investidor e conselheiro do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia de São
Paulo)

 

 


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